A Câmara dos Deputados vota nesta quarta-feira (20) um projeto de lei que tenta pôr freios no escandaloso descaso das plataformas digitais com a infância e a adolescência. Em tempos em que o lucro das big techs vale mais do que a segurança das nossas crianças, essa é uma batalha necessária — e urgente — para quem não aceita ver o mercado ditar regras sobre corpos, dados e afetos juvenis.
O que o projeto prevê
O texto obriga as plataformas a oferecerem informações claras sobre riscos e medidas de segurança e a disponibilizar ferramentas fáceis para que pais e responsáveis possam: bloquear contas, limitar a visibilidade de conteúdos, publicar informações sobre os recursos de controle parental e mostrar avisos claros sobre quando essas ferramentas estão em uso e quais configurações foram aplicadas. O governo federal deverá regulamentar diretrizes levando em conta a autonomia progressiva de crianças e adolescentes, conforme a idade. Não dá pra entregar a proteção das nossas crianças às plataformas que só pensam em lucro!
Configurações padrão e responsabilização
Por padrão, as ferramentas terão que limitar a comunicação de estranhos com menores; impedir acesso não autorizado a dados pessoais; restringir tempo de uso; controlar sistemas de recomendação; limitar o compartilhamento de geolocalização; promover educação midiática e até barrar funcionalidades de inteligência artificial que não sejam essenciais ao serviço. Perfis de menores serão vinculados às contas dos responsáveis, que poderão controlar privacidade, operações financeiras, tempo de uso e interações. Quem desobedecer estará sujeito a multas, suspensão temporária ou até proibição de funcionar no Brasil. Se sancionado, o projeto passa a valer um ano depois da sanção presidencial.
“É uma cooperação entre três agentes: o Estado, que fiscaliza; as big techs, que moderam conteúdos e oferecem ferramentas de proteção; e as famílias, que monitoram e educam”, afirma Juliano Maranhão, professor de Direito e Tecnologia da USP.
Perfeito? Não. Mas necessário. Não podemos aceitar que o ônus da proteção recaia só sobre mães e pais que, muitas vezes, não têm formação digital, recursos ou mesmo tempo para disputar com algoritmos projetados para viciar e explorar dados. Precisamos de estatais fortes e fiscalização pública, não de boas intenções das big techs!
“Muitas vezes estão em inglês ou escondidas. Precisam ser desenhadas de forma simples, respeitando a autonomia progressiva de crianças e adolescentes”, alerta Maria Mello, coordenadora de Digital do Instituto Alana.
“Em muitos casos, sequer os pais compreendem os riscos. Esperar que sejam os únicos responsáveis é deixar de pensar no melhor interesse da criança”, destaca Camila Contri, da Coalizão Direitos na Rede.
A fala das especialistas é óbvia, mas precisa ser repetida contra o coro dos que preferem privatizar tudo, inclusive a infância. A defesa de estatais e da regulação pública — bandeira que muitos da esquerda, incluindo setores do PT, levantam — é essencial aqui: controlar plataformas significa controlar fluxos de capital e de dados, coisa que a direita empresarial e seus apoiadores na política jamais vão querer.
Atualização do ECA e o caminho à frente
O debate chega no ano em que o Estatuto da Criança e do Adolescente completa 35 anos. O ECA foi feito antes da internet e não contemplava um cenário em que empresas acumulam dados de crianças para monetização. O projeto que tramita busca complementar o ECA, traduzindo princípios gerais para regras práticas no ambiente digital. Isso é política pública, disputa de projeto de país: proteger nossas crianças exige estatalidade, regulação e fiscalização — e exige derrotar o bolsonarismo e suas ideias de desmanche do Estado.
A votação é um teste. Vai ficar claro quem está do lado das crianças e quem protege os lucros das plataformas e dos bilionários digitais. Se a esquerda organizada — e o PT como peça chave nessa disputa — conseguir converter esse avanço legislativo em realidade, será um passo importante para limitar o poder predatório das empresas de tecnologia. Se ficarmos só no discurso, as empresas vencerão de novo, como sempre. A hora de pressionar deputados e deputadas é agora: nossas crianças não podem esperar.