O relatório da Polícia Federal sobre as movimentações financeiras de Jair Bolsonaro entre março de 2023 e fevereiro de 2024 despeja números que deviam envergonhar qualquer defensor da tal “moralidade pública” que a extrema direita tanto proclama. Não é só truculência política: são milhões em transações que a própria PF coloca sob suspeita de lavagem de dinheiro e outros ilícitos. Quem imaginava que o capitão ia se aposentar como patriota incorruptível, prepare-se para a tragédia cômica — ou para o escândalo mesmo.
Entradas e saídas: a conta não fecha para quem vive de “sacrifício”
No período fiscalizado, R$ 30.576.801,36 entraram nas contas de Bolsonaro, enquanto R$ 30.595.430,71 saíram — um entra e sai que, segundo o relatório, merece investigação aprofundada. “As movimentações estão sob suspeita de serem ocorrências de lavagem de dinheiro e outros ilícitos”, afirma a Polícia Federal. E não é pouca coisa: R$ 19,2 milhões vieram de 1,2 milhão de transações via PIX — sim, um milhão e duzentas mil micropaginas que alimentaram a conta do ex-presidente. R$ 8,7 milhões foram resgates de CDB/RDB em 52 operações; R$ 1,3 milhão veio de três operações de câmbio; R$ 373,3 mil foram proventos; R$ 304 mil de 203 transferências; R$ 166 mil de doze resgates de aplicação; e R$ 99.687,49 de uma previdência privada. Além disso, há DOC/TED, cheques e depósitos online no bolo.
Entre as saídas, também aparecem cifras escandalosas: R$ 18,3 milhões foram aplicados em seis CDB/RDB; R$ 7,5 milhões saíram em quatro transferências DOC/TED; R$ 1,5 milhão foram pagos em 107 títulos — aqueles boletos que todo mundo conhece; R$ 1,1 milhão em 266 operações via PIX; R$ 749 mil foram para previdência privada; R$ 198 mil levantados em 97 saques; e pagamentos de tributos, contas de energia e telefone aparecem em valores menores. Os grandes destinos não surpreendem: advogados, escritórios e empresas que parecem ter se beneficiado com generosidade.
Entre os principais destinatários, destacam-se o advogado Paulo Cunha Bueno (R$ 3,3 milhões) e o escritório DB Tesser (R$ 3,3 milhões). Também figuram uma empresa de engenharia (R$ 900 mil), um escritório de arquitetura (R$ 235 mil) e uma loja de veículos (R$ 130 mil). Houve ainda transferências para Michelle Bolsonaro e para Jair Renan, hoje vereador em Balneário Camboriú. O PL, do qual Bolsonaro é presidente de honra, aparece como depositante com R$ 291 mil — suficiente para lembrar que partido e caixa pessoal trocam favores com muita facilidade.
O relatório não se limita a um único período. Entre fevereiro e agosto de 2024, entraram R$ 1.733.079,19 e saíram R$ 1.345.311,79 — com pagamentos a advogados, a Fabio Wajngarten e repasses para os filhos Carlos e Eduardo. De agosto a dezembro de 2024 foram R$ 872 mil de entrada e R$ 1,2 milhão de saída. E de dezembro de 2024 a junho de 2025, R$ 11 milhões entraram e saíram — período em que Bolsonaro fez oito transferências para Eduardo que somaram R$ 2,1 milhões, além de repasses de R$ 2 milhões para um advogado e R$ 2 milhões para Michelle.
“Indiciamos Jair e Eduardo Bolsonaro por coação a autoridades e por indícios de tentativa de abolição do Estado democrático de direito”, diz o relatório da Polícia Federal. Numa linguagem popular: não se trata apenas de movimentações estranhas, mas de um padrão que se encaixa numa rede de poder, familiares e operadores jurídicos.
É preciso que a investigação avance com rigor e transparência. A podridão do bolsonarismo — política, jurídica e financeira — precisa ser exposta para que o Brasil volte a ter instituições capazes de proteger a democracia. Não basta o espetáculo midiático; é hora de desmontar as engrenagens que permitem que o dinheiro e o poder se metamorfoseiem em impunidade. E que isso sirva de alerta para quem ainda acha que “saída pela direita” é solução: enquanto bilionários reaccionários e suas milícias políticas respirarem, a luta por um projeto popular e estatal, com direitos e soberania, será mais urgente do que nunca.