Numa semana em que o país está sendo novamente convidado a escolher entre avançar ou recuar, o governo Lula escolheu terreno simbólico e político para lançar mais uma medida social: o novo vale-gás, batizado de “Gás do Povo”, terá sua inauguração prevista para a quinta-feira da semana que vem no Aglomerado da Serra, a maior favela de Belo Horizonte. Não por acaso: é ali, entre 50 mil moradores, que a política se encontra com a necessidade concreta — e onde o gesto público tem mais efeito do que qualquer nota empresarial.
‘Gás do Povo’
O programa, elaborado pela Secretaria de Comunicação e pela pasta de Minas e Energia, será enviado ao Congresso via medida provisória e promete alcançar 15,5 milhões de famílias, com custo estimado em R$ 5 bilhões em 2026. Gás do Povo deve beneficiar 15,5 milhões de famílias, dizem os números do Planalto, que chegaram até a projetar 17 milhões, mas recalcularam a meta. A nomeação também ganhou ajuste: saiu o “Gás pra Todos”, entrou o mais direto “Gás do Povo”. A escolha do Aglomerado da Serra foi sugerida pelo ministro Alexandre Silveira — uma jogada certeira, considerando que Minas é palco decisivo nas brigas eleitorais.
O lançamento no maior aglomerado urbano de BH tem mérito estratégico e simbólico. Em estado com o segundo maior eleitorado do país, o gesto é também sinal político contra as forças do mercado e da privatização que nos querem vender a ideia de que o serviço público é gasto, e não direito. O governo aposta no reconhecimento popular, não em cheques das empresas. E isso enfurece quem financia campanhas e adora um leilão das estatais.
“Governo do Brasil: do lado do povo” — Luiz Inácio Lula da Silva
Não é só sobre botar botijão na cozinha. O governo junta isso a outras bandeiras: ampliação da gratuidade na conta de luz e a isenção do Imposto de Renda para quem ganha até R$ 5 mil. Tudo sinais de que o Executivo quer fechar o ciclo da sua retórica com medidas que toquem o cotidiano das famílias. Para nós, que militamos por uma virada mais profunda, é claro que isso só faz sentido se for parte de um projeto mais amplo de fortalecimento das empresas públicas e combate às privatizações — e não um pacote de medidas isoladas para turbinar uma campanha.
Enquanto isso, a direita se reorganiza com melodramas previsíveis. Romeu Zema e Tarcísio de Freitas seguem cortando discursos por conveniência, enquanto o bolsonarismo de sempre tenta se recompor entre fake news e nostalgia autoritária. Lula, por sua vez, tem cobrado lealdade até no almoço de gabinete e aconselhado ministros do Centrão a manter distância de eventos partidários — afinal, o jogo é governar com foco e não virar palanque fragmentado. A ordem é clara: não deixar que o Centrão transforme cada inauguração em balcão de negócios.
Há, claro, o componente eleitoral. Minas pesa, e a presença de Lula na Serra não é casual. Mas reduzir tudo a “rodada eleitoral” é cair no jogo da oposição que acha que política social é merchandising. Nós sabemos que essa disputa é muito mais: é sobre defender a soberania nacional, fortalecer o papel do Estado e recuperar a centralidade da luta popular contra o avanço dos bilionários de sempre.
Se “Gás do Povo” é uma vitrine, que seja uma vitrine que mostre o que nossa gente precisa: serviços públicos fortes, políticas universais mínimas e um projeto que rompa com as velhas alianças com o grande capital. E se o lançamento servir para mobilizar moradores, trabalhadores e ativistas — para discutir como transformar essas medidas em passos para um Brasil menos desigual — então que a Serra seja apenas o começo. Afinal, melhorar a vida do povo é também preparar o terreno para derrubar de vez as estruturas conservadoras que insistem em nos empobrecer.