O resultado do julgamento do ex-presidente Jair Bolsonaro não deve sair antes da próxima semana — e quem esperava um veredito relâmpago levou um belo puxão de orelha do próprio Supremo Tribunal Federal (STF). Por ser a mais alta Corte do país, o STF é o foro onde, em âmbito nacional, só cabem dois tipos de recursos quando há condenação: os Embargos de Declaração e os Embargos Infringentes. É por aí que a novela jurídica pode se arrastar — e, convenhamos, alguns preferiam mesmo que fosse suspense televisivo a fim de inflamar seus |haters| de sempre.
Como os recursos funcionam
Os Embargos de Declaração são, na prática, pedidos de esclarecimento feitos à própria turma que proferiu a decisão. Servem para apontar contradições, omissões ou erros de cálculo de pena; são a ferramenta técnica para ajustes finos do veredito. Em regra, não alteram substancialmente o conteúdo da decisão — ou seja, não espere revoluções miraculosas aí. Esses recursos funcionam como um corretivo formal: corrigem cálculo, esclarecem pontos, mas dificilmente mudam o núcleo da decisão.
Os Embargos Infringentes, por outro lado, são os famosos “recursos que podem abrir o jogo” em decisões não unânimes — ficaram célebres no julgamento do Mensalão. Estão previstos no Regimento Interno do STF tanto para decisões do Plenário quanto para decisões de Turma. No Plenário (11 ministros), o regimento exige que haja pelo menos quatro votos divergentes para que o recurso seja admitido; nas Turmas (com cinco ministros), o texto não traz essa exigência expressa, mas o próprio STF consolidou a prática de admitir o embargo quando dois ministros divergem. Se admitidos, os Embargos Infringentes permitem discutir apenas os pontos que dividiram os votos — não é uma nova prosa sobre todo o processo.
Importante: o Regimento determina que, caso os Infringentes sejam admitidos para julgamento em Plenário, o relator para esse novo julgamento será sorteado entre os ministros da outra Turma. Ou seja, há procedimentos formalizados que arrastam o trâmite, exigem sorteios, distribuição e novas sessões públicas — tudo isso se soma ao calendário e explica por que a expectativa de um “resultado hoje” é ilusão conveniente para quem vive de espetáculo.
O caso em julgamento — a Ação Penal 2668, que envolve Bolsonaro — transpira política. Não se trata só de técnica processual, mas de uma disputa entre dois projetos de país. A direita golpista tenta transformar cada decisão judicial em palanque, em factóide, em festival de teorias conspiratórias. Nós, que militamos pela ruptura com esse campo conservador, sabemos que a batalha judicial é parte de uma frente maior: derrotar politicamente o bolsonarismo e avançar na construção de um projeto popular que recupere e fortaleça o papel das estatais e dos serviços públicos, combatendo privatizações e a dominação dos bilionários de direita.
A dinâmica de recursos no STF dá tempo ao tempo — e também tempo para mobilização, denúncia e resistência democrática. A transparência do processo importa, e a esquerda não pode vacilar: é preciso acompanhar as etapas, cobrar celeridade quando houver protelação indevida e, sobretudo, transformar desfechos jurídicos em ganhos políticos para as massas. Afinal, não basta que a Justiça funcione: é urgente que o povo organizado transforme decisões em políticas que revertam desigualdades.
O calendário judicial manda prudência: preparemo-nos para semanas de tramitação, decisões técnicas e, possivelmente, novos capítulos. Enquanto o Supremo segue seu rito, cabe a quem não compactua com a extrema direita continuar a construir força social e política para desmantelar o conservadorismo e avançar em um projeto popular de poder — porque a luta não depende só de sentenças, depende da nossa organização nas ruas, nos bairros e nas fábricas. Quem acha que isso vai acabar em espetáculo midiático vai se decepcionar; quem luta por democracia e soberania sabe o que fazer.