No calor das redes, onde a mentira se disfarça de furo jornalístico e ganha vida própria, circulou uma história digna de roteiro de novela barata: um vídeo no TikTok afirmava que o ministro do STF André Mendonça quase foi vítima de um atentado aéreo — que sua aeronave teria sido “sabotada” e que alguém teria ligado avisando que o avião estava “batizado”. É #FAKE. A peça viral surgiu dias depois de Mendonça ter sido indicado como novo relator do inquérito sobre fraude no INSS — coincidência conveniente para aqueles que vivem da desinformação e do pânico seletivo.
O que viralizou
No dia 28 de agosto, um post no TikTok com mais de 30 mil visualizações exibia um homem narrando, com a naturalidade dos conspiracionistas, que “saboteram o avião do André Mendonça” e que o ministro teria recebido uma ligação dizendo que não poderia embarcar porque o avião estava “batizado”. O mesmo vídeo alegava que o suposto atentado teria sido inspirado na queda que vitimou o ex-ministro Teori Zavascki, em 2017, e chegou a cunhar um nome cômico e macabro: “Teoriza”. Como sempre acontece, uma história rasteira pegou elementos de tragédias reais e os mexeu numa panela de boato para que o caldo ficasse mais saboroso à direita radical.
Por que a história não passa de mentira
A própria assessoria de Mendonça refutou a narrativa. “Não houve nenhuma ligação, nenhuma viagem com amigo e nenhuma suspeita em qualquer voo que o ministro tenha tomado. Vale dizer que o ministro só viaja, basicamente, em voos comerciais. Então isso tudo é obra de pura ficção, da criatividade do povo, não sabemos de onde veio isso” — Assessoria de imprensa do ministro André Mendonça (via WhatsApp). O STF também negou qualquer ocorrência: “A informação não é verdadeira, não houve nada nesse sentido” — Assessoria do STF (por e-mail).
Além das negativas oficiais, cabe lembrar o que realmente apurou a investigação sobre o acidente que matou Teori Zavascki: não houve conspiração misteriosa apontada; a Aeronáutica concluiu que o mau tempo e a visibilidade reduzida foram fatores determinantes, e o piloto, ao tentar nova aproximação, perdeu a noção de altitude, resultando no impacto da asa com a água. Não é só sensibilidade política; é fato técnico. E é por isso que essa história de “Teoriza” soa tão rasteira: é tentativa óbvia de explorar uma tragédia para semear medo e desviar atenções.
O timing da fake é revelador. Três dias antes do boato viralizar, Mendonça foi indicado para relatar o inquérito sobre fraudes no INSS — um assunto que mexe com interesses poderosos e com a narrativa que a direita tenta construir sobre “ameaças ao Estado de Direito”. Não dá para ser ingênuo: boatos são arma política. A direita bolsonarista e seus satélites midiáticos sabem usar essas mentiras como ferramentas de assédio, para inflamar bases e tentar deslegitimar instituições quando convém.
Mas basta de martelar no vazio: a verificação mostra que a história desaba como castelo de cartas. A circulação de pânico gratuito nas redes é parte da velha estratégia de desmoralização, que mistura medo, fake news e espetáculo para confundir o povo. Quem planta boato colhe descrédito — e isso não é inocente.
Ao fim, o episódio é um lembrete incômodo: em tempos de polarização feroz, a desinformação age como milícia digital. Não se trata só de corrigir uma mentira pontual; trata-se de combater a maquinaria de falsidades montada para proteger interesses de direita, desestabilizar processos democráticos e desinformar a população. Fique atento: verifique fontes, desconfie de narrativas espetaculosas e lembre que a luta por uma imprensa livre e honesta é também parte da luta contra o bolsonarismo e suas teias de ódio.