A decisão do ministro André Mendonça, do Supremo Tribunal Federal, de permitir que presos decidam se comparecem ou não a oitivas da CPMI do INSS acendeu mais um capítulo dessa novela real — e criminosa — sobre o desvio de recursos de aposentados. O presidente da comissão, Carlos Viana (Podemos-MG), avisou que vai recorrer da medida para forçar a presença de Antônio Carlos Camilo Antunes, o conhecido “Careca do INSS”, e de outros implicados. A CPMI marcou a data: segunda-feira (15) para ouvir Antunes; a bancada quer respostas rápidas sobre o rombo bilionário que varreu os proventos de quem mais precisa.
Investigação, prisões e tentativas de blindagem
A Polícia Federal prendeu Antunes e o empresário Maurício Camisotti na sexta (12). Eles passaram por audiência de custódia e continuam detidos. Careca do INSS é apontado pela PF como o principal operador do esquema de desvio de dinheiro de aposentados e pensionistas, responsável por movimentações financeiras suspeitas, incluindo transferências de cerca de R$ 9,3 milhões a pessoas ligadas a servidores do INSS entre 2023 e 2024. Em meio a isso, a CPMI aprovou a quebra dos sigilos bancário, fiscal e telefônico de Antunes e requisitou relatórios do COAF sobre transações de 2017 a 2025 — em total, a comissão aprovou 364 requerimentos de quebra de sigilo envolvendo diversas pessoas e entidades.
“É fundamental que eles compareçam para que possamos esclarecer, com mais rapidez, tudo o que aconteceu. Respeito a decisão do ministro, mas considero injustificável permitir que não venham depor […] Esperamos que a Corte determine a obrigatoriedade da presença dos investigados na CPMI” — Carlos Viana (presidente da CPMI)
Naturalmente, as defesas não estão colaborando com o calendário da transparência pública. “A defesa afirmou à GloboNews que Antônio Carlos Camilo Antunes não comparecerá.” — Defesa de Antônio Carlos Camilo Antunes E os advogados de Camisotti disseram que “não está definido se o empresário irá à CPMI” — Advogados de Maurício Camisotti, enquanto a sua defesa também declarou que não existe motivo que justifique a prisão no âmbito da operação. “Não haver qualquer motivo que justifique sua prisão no âmbito da operação relacionada à investigação de fraudes no INSS” — Defesa de Maurício Camisotti.
A cena é quase cômica se não fosse trágica: enquanto milhões de aposentados lutam para pagar contas, aparecem esquemas com associações de fachada, propina a servidores e, pasme, apreensão de um carro de Fórmula 1 na casa de um dos alvos — ostentação e pilhagem no mesmo episódio.
Como funcionava o esquema
A investigação da CGU e da PF mapeou a mecânica perversa: entidades ofereciam “serviços” a idosos e, com assinaturas forjadas, inseriam descontos de mensalidades diretamente na folha de pagamento do INSS. As associações cadastravam, sem autorização, aposentados e pensionistas do INSS e passavam a descontar mensalidades diretamente na folha de pagamento. Em muitos casos, os próprios idosos sequer sabiam que haviam sido filiados; havia registros de pessoas cadastradas no mesmo dia em mais de uma entidade com erros de grafia idênticos — carimbo claro de fraude em série. Diretores de entidades de fachada, servidores do INSS e empresários beneficiários formavam uma cadeia que transformou o contracheque do trabalhador em fonte de lucro ilícito.
Parlamentares da oposição foram os mais ativos na aprovação dos pedidos da CPMI, o que abre outra discussão: por que setores políticos que costumam bradar contra o “aparelho do Estado” agora correm para investigar? Talvez porque, quando o saque atinge a vida de velhos e pobres, nem mesmo os paladinos do mercado conseguem fingir indiferença. Ou será que a disputa é por holofotes e narrativa?
Cabe aqui a pergunta que não quer calar: até quando os aposentados vão pagar a conta da roubalheira de uma elite que privatiza tudo, ataca serviços públicos e depois lucra em cima do desespero alheio? É hora de desmontar esse esquema e responsabilizar os envolvidos — e também de defender as estatais e a previdência pública como antídotos contra a ganância dos bilionários. O movimento deve ser amplo: investigação rigorosa, coerência política e mobilização social para que os direitos dos trabalhadores e aposentados não sejam mais moeda de troca para negociatas. Quem pagou a conta até agora já não aguenta mais calar.