Desde a manhã deste domingo (14), o espetáculo grotesco da extrema direita ganhou mais um capítulo: Jair Bolsonaro deixou a prisão domiciliar em Brasília para realizar procedimentos médicos no Hospital DF Star, escoltado por um comboio da Polícia Federal — tudo autorizado pelo ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal. Não é luxo, é ordem judicial; e, mesmo assim, o ex-capitão continua sendo tratado com a mistura de privilégios e vigilância que marca sua trajetória política: protegido à meia-boca, vigiado à moda da República. Quem esperava vergonha alheia, teve moderada dose de espetáculo político.
Procedimentos e condicionantes
Segundo o relatório médico apresentado ao STF, Bolsonaro foi autorizado a tratar lesões na pele descritas como “nevo melanocítico do tronco” e “neoplasia de comportamento incerto ou desconhecido da pele”. A autorização prevê que ele permaneça no hospital apenas pelo tempo estritamente necessário e que retorne imediatamente à residência. Além disso, a defesa tem a obrigação de apresentar um atestado de comparecimento com data e horários dos atendimentos no prazo de 48 horas após os procedimentos.
Não é uma chácara nem um retiro espiritual: é prisão domiciliar com regras. A fiscalização prevê revista em todos os carros que entrem e saiam da casa do ex-presidente, além do monitoramento permanente da porta por agentes da Polícia Penal do Distrito Federal — agentes que, por determinação de Moraes, não usam uniforme nem exibem armas. Curioso: liberdade controlada com requintes de discrição! Será que era para ninguém saber que a “saída médica” teria escolta?
Prisão domiciliar e condenação histórica
Bolsonaro está em prisão domiciliar desde 4 de agosto, depois que Moraes entendeu que ele descumpriu medidas cautelares anteriores, entre elas a proibição de usar redes sociais, inclusive por terceiros. A defesa, como era de se esperar, rebateu dizendo que o ex-presidente tem cumprido todas as medidas. Já vimos esse roteiro: a negação sistemática, o teatrinho de vítima e a tentativa de reconstruir a narrativa de perseguição.
Na última quinta (11), a Primeira Turma do STF proferiu uma decisão histórica: condenou Jair Bolsonaro a 27 anos e 3 meses de prisão por participação em trama golpista — a primeira vez na história republicana que um ex-presidente recebe pena por golpe de Estado. Por 4 votos a 1, os ministros entenderam que ele cometeu cinco crimes: golpe de Estado; tentativa de abolição violenta do Estado democrático de direito; organização criminosa armada; dano qualificado contra o patrimônio da União; e deterioração de patrimônio tombado. Sim: são crimes gravíssimos, com pena que, em tese, exige regime fechado inicialmente.
O recurso existe, claro. No jogo jurídico, a defesa tentará desgastar prazos, apelar, protocolar liminares. Mas a gravidade da condenação abre uma cratera na narrativa impune que os apoiadores da extrema direita tentavam construir com seu messianismo militarizado. Para quem pensa que tudo volta à “normalidade” com a política do mercado e dos bilionários, é bom lembrar: as instituições reagiram — mesmo que tardiamente — quando a democracia foi atacada.
A saída de Bolsonaro ao hospital é mais um episódio da saga de um homem que transformou seu governo em máquina de retrocessos e em fábrica de mitos. A vigilância judicial, por ora, equilibra-se entre permitir atendimento médico e impedir que ele use qualquer movimentação como palanque. Cabe à esquerda, aos movimentos populares e ao PT — que devemos apoiar sem ingenuidade, mas com unidade estratégica — transformar essa condição jurídica em fortalecimento de um projeto democrático e anticapitalista que proteja o povo dos interesses dos bilionários e da privataria que eles tanto desejam. E que fique claro: não é só por justiça contra um político; é pela defesa do Estado e das estatais que garantem serviços e direitos ao povo. Quem pensa em retrocesso que olhe bem o placar: a história não dá cheque em branco para os golpistas.