O assassinato a tiros do ex-delegado-geral de São Paulo Ruy Ferraz Fontes, ocorrido em Praia Grande, escancarou mais uma vez a face cruel de um país onde a violência se fortalece quando se afrouxam regras e se vende impunidade. Ruy, que teve papel central no combate ao crime organizado e nas investigações pioneiras sobre o PCC, foi executado em plena luz do dia — um recado brutal para quem acha que a ordem pública se resolve com discurso de ódio ou privatização das forças do Estado. O crime expõe, mais uma vez, a podridão que cresce com a banalização das armas de guerra em nosso cotidiano.
Proliferação de armas
Ricardo Lewandowski, ministro da Justiça, colocou as forças de segurança federais à disposição do governo de São Paulo e telefonou ao governador Tarcísio de Freitas para prestar solidariedade. Em entrevista, Lewandowski não economizou diagnóstico: atribuiu a execução, em grande parte, à circulação desenfreada de armamentos — inclusive de calibre militar — que facilmente descem do discurso público para as mãos do crime. “No passado recente houve uma política de disseminação dessas armas sem controle. O atual governo está tentando agora, neste momento, fazer um controle dessas armas, sobretudo com relação aos CACs [Colecionadores, Atiradores Desportivos e Caçadores]” — Ricardo Lewandowski. Ele lembrou ainda que o governo federal dispõe de banco de dados balísticos e de DNA que podem ajudar as investigações. “Nós nos colocamos à disposição do estado, sobretudo no que diz respeito à polícia científica. Temos um banco de dados no que diz respeito à balística, DNA, informações, tudo isso nós colocamos à disposição, se necessário, do governo de SP” — Ricardo Lewandowski.
A responsabilidade política é clara: foram anos de conivência e flexibilização de regras que transformaram o discurso pró-armas em política pública. É absurdo que, em nome de discursos de segurança, se entregue o país aos mercadores de armas. E não adianta fingir surpresa agora — quem afrouxou controles plantou as condições para esse tipo de crime.
Resposta e investigação
A apuração formal é da Polícia Civil de São Paulo, mas a reação administrativa já vem em duas frentes: o governo paulista anunciou a criação de uma força-tarefa e a cúpula federal colocou-se como apoio técnico. “O momento é de luto, mas também de muito trabalho para identificar, o mais rápido possível, os criminosos que participaram dessa ação covarde” — Guilherme Derrite (Secretário da Segurança Pública de SP). O delegado-geral Artur Dian chegou a informar que a arma do ex-delegado estava guardada na bolsa, detalhe que adiciona camadas ao caso e à circulação de armas entre civis: “A arma do ex-delegado-geral Ruy Ferraz estava guardada na bolsa” — Artur Dian.
O diretor-geral da Polícia Federal, Andrei Rodrigues, e o secretário nacional de Segurança Pública, Mário Sarrubbo, já conversaram com Derrite, sinalizando cooperação institucional. Resta saber se essa cooperação será operativa e eficaz — e não apenas encenação midiática. Como militante e jornalista, pergunto: por que precisamos sempre de tragédias para que governo federal e estaduais troquem informações que deveriam ser rotina? Quem lucra com esse atraso e com a desarticulação das políticas públicas de segurança?
A barbárie de Praia Grande é também uma mensagem política: enquanto a direita fanática promove desvios de rumo — flexibilizando armas, atacando o serviço público e vendendo a ideia de segurança por empresa —, nós que defendemos o Estado forte, as estatais de investigação e a coordenação entre poderes precisamos responder politicamente com firmeza. Lula e o PT, com todas as contradições, representam hoje a única força capaz de retomar políticas públicas que confrontem de fato o crime organizado e a lógica do mercado armado. Não bastam palavras; é preciso ação, investimento em polícia científica, inteligência social e desarmamento real.
A família de Ruy Ferraz e as forças de segurança merecem respostas e justiça. Que a investigação dê resultados rápidos e que sirva de alerta: não aceitaremos que a segurança seja bandeira de privatista e milicianos ideológicos. Se queremos paz, é preciso desmontar as redes que alimentam a violência — e isso passa por política pública séria, por controle de armas e por um projeto popular que subverta a lógica do lucro que torna a vida descartável. Onde está a coragem para fazer isso? Vamos cobrar.