A Executiva Nacional do União Brasil jogou um ultimato no colo dos seus filiados: 24 horas para deixarem cargos no governo federal ou sofrerão punições por “infidelidade”. A ordem foi anunciada em meio a um clima de pânico e tentativa de limpeza de imagem depois de reportagens que ligaram o presidente do partido, Antonio de Rueda, a suspeitas nada inocentes. Enquanto Rueda põe o avião no rumo de Brasília para “conversar” com o ministro do Turismo, Celso Sabino, a esquerda precisa olhar esse espetáculo com o olho clínico de quem sabe que a direita se desmonta na exposição pública das suas rachaduras e das suas alianças sujas.
“Assim que pousar vou ligar para ele. Ainda não falamos”, disse Antonio de Rueda. O presidente do partido reafirmou que a decisão da Executiva vale “para todos” — e descartou estender o prazo ou conceder licença a Sabino, que é deputado licenciado e foi indicado à pasta pela bancada do União Brasil na Câmara. Trata-se de uma ordem de marcha — mais espetáculo do que política séria — para tentar salvaguardar a respeitabilidade do partido.
A pressa do União Brasil tem explicação: denúncias publicadas pelo UOL e pelo site ICL, com depoimento do piloto Mauro Mattosinho à Polícia Federal (confirmado pelo g1), apontaram que a Táxi Aéreo Piracicaba teria transportado pessoas suspeitas de lavar dinheiro para o Primeiro Comando da Capital (PCC). Mattosinho afirmou ainda ter ouvido, dentro da empresa, que Rueda seria dono oculto de aeronaves. Importante frisar que, até o momento, Rueda não aparece como formalmente investigado no inquérito da PF — mas a suspeita já é suficiente para criar um terremoto político no campo do bolsonarismo-liberal.
“Estou sendo alvo de ilações irresponsáveis e sem fundamento… há um pano de fundo político”, afirmou Rueda, defendendo seu nome e o do partido. A defesa é a mesma cartilha de sempre: desacreditar a investigação e apontar inimigos imaginários. Mas a unidade que o União Brasil busca agora, com ameaças de punição interna, parece mais um conserto de fachada do que uma solução verdadeira para os problemas éticos e jurídicos que os atingem.
Reunião com Lula
A expectativa é que o ministro Celso Sabino se reúna ainda hoje com o presidente Luiz Inácio Lula da Silva para tratar da crise. Na quinta, os dois conversaram por telefone, mas, segundo interlocutores do Palácio do Planalto, Sabino não chegou a formalizar pedido de demissão. “Sabino não formalizou um pedido de demissão”, disseram interlocutores do Palácio do Planalto. Enquanto isso, o PT e a presidência têm nas mãos a decisão de preservar a governabilidade sem ceder ao conluio com pessoas e práticas que corroem o estado democrático.
Se há um ensinamento desse episódio, é que a direita se organiza mais para proteger interesses e carreiras do que para combater a desigualdade; e isso é um convite à intervenção política popular. A federação entre União Brasil e Progressistas, construída há um mês, já havia determinado que filiados deveriam desembarcar do governo no início de setembro — ou seja, há um movimento concertado para repelir qualquer vínculo institucional que comprometa a imagem pública da nova aliança.
Do ponto de vista da luta política, a situação exige firmeza: não adianta o governo negociar abrigo para gente de reputação duvidosa só para não enfrentar uma crise de curto prazo. Lula e o PT estão no centro de uma nova etapa de disputa contra o projeto neoliberal e autoritário que campeia nas elites — é hora de deixar claro que não haverá espaço para conchavos que fragilizem o Estado e as estatais, ou que coloquem em risco a luta pelo projeto popular.
O circo montado pelo União Brasil pode até render manchetes e rodar redes sociais, mas a esquerda precisa transformar o desgaste da direita em fortalecimento das políticas públicas e em mobilização política real. Que a reunião de hoje sirva para depurar responsabilidades, afastar quem se relaciona com práticas criminosas e reafirmar um compromisso com o Brasil que queremos: soberano, com estatais fortes, e sem concessões aos bilionários e aos cúmplices do crime organizado.
