A escalada beligerante de Jair Bolsonaro contra o Supremo Tribunal Federal (STF) não foi apenas mais um capítulo de seu populismo raivoso: foi o canto do cisne de um projeto antidemocrático prestes a ruir. Ao apostar tudo em manifestações e narrativas de “confronto ao sistema”, o ex-presidente cavou a própria sepultura política e acabou sob prisão domiciliar. A movimentação desesperada mostra, de forma cristalina, que o cerco jurídico se fecha cada vez mais sobre quem tentou usar as instituições em favor de um golpe de Estado.
O “tudo ou nada” de Bolsonaro
Nas manifestações do último dia 3, Bolsonaro deixou de lado qualquer sutileza e levou o país a assistir a um espetáculo de autoproteção política. Embalado por referências ao estilo de Donald Trump, buscou polarizar e pressionar a Corte, como se a mera gritaria popular pudesse alterar decisões judiciais. A estratégia, porém, revelou-se um tiro pela culatra: ao desafiar a legalidade e envolver familiares e apoiadores em pronunciamentos gravados, viu o STF reagir com ainda mais rigor.
A percepção interna do Supremo é que o ex-chefe do Executivo partiu para o “tudo ou nada” porque enxerga o iminente julgamento da ação penal sobre a tentativa de golpe como sua sentença final. Crendo que consegue mobilizar as ruas para forçar uma revisão dos processos, Bolsonaro expôs não só a fragilidade de seus argumentos, mas também a fúria de Alexandre de Moraes e dos demais ministros. A prisão domiciliar, imposta nessa toada, não foi um capricho autoritário: foi a resposta proporcional de uma Suprema Corte determinada a fazer valer a lei.
Pressão exógena e fortalecimento da investigação
Enquanto tentava pintar suas multas, bloqueios de bens e restrições como “perseguição política”, Bolsonaro apostava também em cartas de fora. Em Brasília, ministros do STF mencionam o risco real de sanções secundárias vindas dos Estados Unidos – tática já testada por Trump – como forma de intimidar juízes que não se curvam a interesses eleitoreiros. Mas quanto mais tentam coagir o Judiciário, mais robustas ficam as provas contra o antigo mandatário e seus aliados.
Para conter qualquer interferência, a Polícia Federal abriu inquérito por obstrução de Justiça, investigando a participação de parlamentares e assessores em manobras para protelar decisões. O cerco apertou: nem as ameaças de retaliação a ministros surtiram efeito. O Supremo segue firme, ciente de que o principal esforço agora é não desviar o foco do julgamento marcado para setembro – ocasião em que será analisado o núcleo essencial da conspiração golpista.
As manifestações promovidas por apoiadores, os gestos midiáticos de filhos de Bolsonaro e declarações inflamadas de parlamentares bolsonaristas só alimentam o arcabouço probatório. Cada grito de “intervenção militar” e cada tentativa de transferir o debate para narrativas conspiratórias fortalecem a argumentação de que houve sim um plano organizado para subverter a vontade popular e inviabilizar o funcionamento regular das instituições.
As investidas externas – na forma de supostos ataques econômicos e ameaças de boicote – pouco têm a ver com defesa da soberania nacional e muito com proteger interesses de bilionários alinhados à extrema direita. Agora, a aposta de setores conservadores em usar o nome de potências estrangeiras em retaliações políticas expõe o caráter oportunista de quem nada tem a oferecer além de caótico rancor.
No fim das contas, o que parecia um gesto de força e desafio ao STF só consolidou a imagem de um político acuado, sem bases legais ou eleitorais para sustentar seu legado de destruição democrática. Bolsonaro pagou caro por transformar a política em guerra de narrativas e, ao se refugiar em casa, confirma que não há força maior do que a lei bem aplicada. Nem a gritaria nas ruas, nem o barulho nas redes sociais terão poder para apagar os elementos cabais que comprovam a tentativa de golpe. A justiça, agora, caminha a passos largos para dar conta de quem apostou tudo em impedir a própria derrota nas urnas.