A Câmara dos Deputados aprovou, por 296 votos a 145, um projeto que tira dos limites do arcabouço fiscal os gastos temporários com saúde e educação financiados pelo Fundo Social — uma batalha técnica com enorme impacto político e social. Deputados ainda analisam os destaques; depois, a bola segue para o Senado. O arcabouço fiscal, que substituiu o antigo teto, freia o crescimento das despesas públicas e condiciona investimentos; por isso, retirar essas verbas do cálculo representa uma tentativa do governo Lula de abrir espaço para direitos sociais sem ser sufocado pelas regras austeritárias. O Brasil não pode mais ficar refém de regras que amarram o investimento em direitos!
O autor da proposta, Isnaldo Bulhões (MDB-AL), defende que o aumento de 5% dos recursos do Fundo Social para saúde e educação só faz sentido se ficar fora do arcabouço. “Só tem sentido aumentar os investimentos em 5% com saúde e educação se tiver fora do arcabouço. É 5% do Fundo Social. Se continuar no arcabouço não há condição legal de aumentar o recurso como há a intenção do legislador em 5% para saúde e educação” – Isnaldo Bulhões (MDB-AL). Do outro lado, a direita tradicional e os liberais tentam transformar a questão em espetáculo: para eles, tudo é maquiagem contábil e “contorcionismo matemático”. “Todo mundo fica fazendo cara de paisagem, achando que isto aqui está tudo certo. Ah, porque a Saúde é importante, porque a Educação é importante… Fazer isso é pura maquiagem contábil” – Gilson Marques (Novo-SC). Claro — a mesma direita que corta direitos e protege bilionários agora se preocupa com “maquiagem”. Hipocrisia explícita!
O PSOL e a base do governo sustentaram o projeto como essencial para ampliar a capacidade do estado de garantir direitos. “Esse projeto vai na linha correta de ampliar a possibilidade de o Governo Lula, para garantir esses direitos à população, possa ter mais dinheiro para investir naquilo que vai levar ao desenvolvimento real do nosso povo” – Tarcísio Motta (PSOL-RJ). Não é apenas contabilidade: é política. Lula e o PT não são uma opção neutra — são, diante da dura correlação de forças, agentes centrais para abrir espaço a uma nova etapa de luta contra o capital concentrado no país. Precisamos, porém, estar vigilantes para que esse instrumento seja usado para fortalecer serviços públicos, estatais e políticas redistributivas, e não para tapear o povo.
Empréstimos internacionais
A proposta também afasta do limite do arcabouço as despesas financiadas com empréstimos internacionais, sob o argumento de que são contratos com fins determinados e, portanto, não deveriam pressionar o teto. “Não faz sentido que sejam submetidos ao limite de gastos, uma vez que são objeto de contratos firmados, com a obrigação de serem utilizados em determinados fins” – Isnaldo Bulhões (MDB-AL). Já do lado oposto, o deputado Kim Kataguiri (União-SP) acusou o governo de querer retirar do limite o empréstimo para comprar caças Gripen, levantando suspeitas e críticas. “O principal empréstimo que estão tirando do arcabouço é o empréstimo de um projeto chamado FX2, da compra de caças Gripen, que estão sob suspeita de tráfico de influência” – Kim Kataguiri (União-SP). A crítica deve ser investigada — transparência é necessária —, mas não pode virar pretexto para bloquear recursos sociais.
O Fundo Social recebe cerca de R$ 30 bilhões por ano, e a lei sancionada em julho destinou 5% desses aportes — aproximadamente R$ 1,5 bilhão anuais — a educação e saúde pelos próximos cinco anos. O projeto aprovado também retira esses investimentos do cálculo da meta fiscal do governo, numa conjuntura em que a previsão de déficit para 2025 é de R$ 73,5 bilhões. Isso significa margem política e financeira para priorizar direitos, se houver vontade e mobilização popular para que o dinheiro chegue onde tem de chegar.
A batalha agora vai ao Senado — e aí se define se teremos realmente menos amarras para investir em educação e saúde ou se a direita conseguirá impor seu vocabulário de austeridade e chantagem. Não se trata apenas de técnica contábil: é uma disputa sobre quem decide os rumos do país. Vamos cobrar que esses recursos fortaleçam o serviço público, defendam as estatais e confrontem os interesses dos bilionários que nunca se preocuparam com o povo. Mais do que votos no plenário, precisamos de pressão nas ruas e nas bases sociais para transformar essa abertura fiscal em políticas concretas que mudem a vida da maioria. Retirar esses gastos do arcabouço é defender saúde e educação contra a austeridade dos bilionários.