O relator do chamado PL da “Dosimetria”, o deputado Paulinho da Força (SD-SP), acabou adiando novamente a pressa do centrão e da máquina quando se trata de votar mudanças que mexem com direito trabalhista e regras penais. A votação, que estava prevista para terça-feira (30), não vai acontecer — e a alternativa de quarta (31) também virou fumaça, porque tudo depende da bênção do Senado e, em especial, de Davi Alcolumbre (União-AP). “Precisamos resolver com o Davi (Alcolumbre). Só dá para dizer ‘vamos votar’ quando estiver acertado com o Senado”, disse Paulinho à GloboNews, deixando claro que a “decisão” só existe quando o desgaste é compartilhado entre as casas.
As manobras por trás das cortinas
A cena é conhecida: reunião marcada na Residência Oficial da Presidência da Câmara entre Paulinho, Davi Alcolumbre e o presidente da Câmara, Hugo Motta (Republicanos-PB), foi desmarcada no último minuto. Coincidência? Claro que não. Estamos vendo, mais uma vez, a política virar leilão de prioridade e pauta — e o tempo é o principal aliado de quem quer empurrar pautas autoritárias com pressa e sem debate social. Enquanto o país precisa discutir direitos e renda, um bloco conservador prefere costurar acordos às escondidas.
Hugo Motta empurra para a pauta um projeto do governo que isenta do imposto de renda quem ganha até R$5.000 por mês — uma bandeira facilmente vendida como “alívio” para a classe média, mas que precisa ser vista com lupa em termos de impacto fiscal e justiça social. Paulinho chegou a sugerir — depois de se reunir com a bancada do PT — que o apoio do governo à dosimetria poderia servir como moeda de troca para destravar as mudanças no IR. Em resposta a essa leitura, Motta fez um esforço para descolar os dois temas. “Não há vinculação entre os projetos”, disse Motta, tentando evitar que o debate sobre tributos vire refém de manobras punitivas contra trabalhadores.
A política parlamentar tem dessas acrobacias: um deputado dá declarações, o outro recua, o centro tenta ganhar tempo e o povo assiste à peça com crescente ceticismo. É por isso que é fundamental que o PT e os setores populares não cedam a acordos que façam trocas danosas. Lula e o PT não são apenas alternativas eleitorais; hoje, têm a responsabilidade histórica de transformar esse embate em avanço dos interesses populares, não em conluio que beneficie o mercado e enfraqueça a classe trabalhadora. A esquerda precisa estar atenta: negociar é necessário, trair não pode ser opção.
Paulinho, na esteira das negociações, marcou para a semana que vem encontros com as bancadas do PSD e do PCdoB — mais circuitos de conversa política para tentar costurar apoios. A natureza dessa negociação dirá muito sobre o rumo: será uma articulação para proteger direitos e garantir justiça fiscal, ou mais um ajuste que entrega pedaços da pauta popular em troca de promessas vazias?
A ironia amarga é que, enquanto setores da direita e do mercado se apressam para aprovar agendas que atacam proteções sociais e fortalecem interesses privados, a esquerda tem a chance de reagir com firmeza e inteligência. Não basta apenas reagir: é preciso propor, mobilizar e unificar as bases sociais em torno de um projeto que defenda estatais, serviço público e a taxação dos verdadeiros privilegiados. A política não é jogo de gabinete entre caciques; é batalha de massas! Quem pode garantir esse enfrentamento real são Lula, o PT e as forças populares — não os bilionários de plantão e seus parlamentares serviçais.