Os dois anos de presidência do ministro Luís Roberto Barroso no Supremo Tribunal Federal deixaram marcas que vão além das capas dos jornais: foram decisões que tocaram a economia, os direitos civis, a vida cotidiana e — sobretudo — a batalha pela democracia num país ainda assaltado pelo bolsonarismo e suas tentativas de normalizar o golpe. Aqui vão os pontos centrais desse período, com a franqueza que o momento exige. Nem o autoritarismo, nem o discurso do lucro acima da vida passarão sem resposta.
Trama golpista e o 8 de janeiro
A condenação, inédita, de réus envolvidos na tentativa de golpe, com o nome de Jair Bolsonaro entre eles, foi um marco histórico. Barroso acompanhou o julgamento da Primeira Turma e não hesitou em qualificar o momento. “Acredito que nós estejamos encerrando os ciclos do atraso na história brasileira, marcados pelo golpismo e pela quebra da legalidade constitucional. Sou convencido que algumas incompreensões de hoje irão se transformar em reconhecimento futuro” — disse o ministro ao fim do processo. Um divisor de águas? Sem dúvida. Mas não pense que a defesa da democracia se resolve no gabinete do Supremo: é luta para ser ampliada nas ruas e nas urnas!
Responsabilidade das redes sociais
O STF decidiu que plataformas digitais podem ser responsabilizadas por conteúdos ilícitos de usuários e precisam remover posts que configuram crimes mesmo sem ordem judicial. Bom para frear a desinformação e o ódio que alimentam a extrema direita — embora saibamos que regulação exige rigidez contra os gigantes do lucro e zelo pela liberdade popular.
Drogas, saúde e direitos individuais
A Corte estabeleceu uma linha prática: até 40 g de maconha ou seis plantas fêmeas configuram porte para uso pessoal — descriminalização parcial, com medidas educativas em vez de encarceramento. Sobre saúde, confirmou que Testemunhas de Jeová podem recusar transfusão por crença (com limites no caso de menores) e ordenou providências para atendimento de pessoas trans no SUS. Avanços que protegem indivíduos, mas que precisam caminhar junto à ampliação do sistema público de saúde.
Meio ambiente e Estado
O STF exigiu do governo federal um plano para combater queimadas e desmatamento na Amazônia, pressionando quem, por interesses econômicos e políticos, prefere lucro imediato à vida do planeta. Estado forte e ativo é antídoto contra devastação e privatizações predatórias. Cabe ao movimento popular vigiar e cobrar a execução dessas medidas.
Outras decisões relevantes: vedação de revistas policiais baseadas em aparência; obrigação de o Estado indenizar vítimas de balas perdidas em operações; rejeição da ideia das Forças Armadas como “poder moderador”; fim da prática de culpar vítimas em crimes sexuais; correção do FGTS pelo IPCA; validação da execução imediata de penas do júri; autorização para contratação de novos servidores via CLT (encerrando um litígio de décadas); homologação de acordo de reparação da tragédia de Mariana; e tese que permite símbolos religiosos em prédios públicos quando são expressão de tradição cultural.
Barroso, em sua despedida, buscou um tom conciliador: “Pacificação não significa as pessoas abrirem mão das suas convicções, dos seus pontos de vista, de sua ideologia. Pacificação tem só a ver com civilidade, respeitar o outro na sua diferença. Entender que quem pensa diferente de mim não é meu inimigo”, afirmou em discurso emocionado. Palavras bonitas — e necessárias —, mas que não substituem a combatividade política contra quem quer desmontar direitos e entregar o país ao mercado e aos bilionários.
O balanço é misto: o STF, na presidência de Barroso, deu passos importantes na defesa de direitos e da Constituição, freando pretensões autoritárias. Ainda assim, a democracia exige mais: instituições fortes, Estado presente, estatais soberanas e um projeto popular que desmonte as estruturas de poder conservador. A tarefa é clara: ampliar essas vitórias no terreno da política, fortalecer o movimento organizado e dar corpo a uma alternativa que não negocie o futuro do povo brasileiro com a ganância do capital. O juiz fez sua parte — agora é hora de unir resistência nas ruas, câmaras e sindicatos para transformar decisões em realidade social.