Lula e Trump: até quando vamos encenar um teatro diplomático em que apenas um lado tem voz? Enquanto o Brasil sofre com o “tarifaço” imposto por Donald Trump, o governo tenta – em vão – arrancar das autoridades norte-americanas alguma abertura. Mas, se depender de Washington, negociações serão eternamente adiadas, empurrando no lombo do povo brasileiro um aumento de custos que atinge do produtor rural ao consumidor final.
Tarifaço e a arrogância do Tio Sam
Em 6 de novembro, entrou em vigor a sobretaxa de 50% sobre produtos nacionais vendidos nos Estados Unidos. Resultado? Cerca de 35,9% das exportações brasileiras – de carnes ao café – sofrem no bolso. Enquanto bilhões de dólares vão para cofres de indústrias norte-americanas, agricultores e trabalhadores brasileiros ficam com a fatura da insensatez protecionista de Trump. Não bastasse o golpe na economia popular, a lista de exceções – suco de laranja, aeronaves, petróleo – revela a hipocrisia de quem diz “liberdade de comércio” mas só defende os próprios interesses.
“Lula conversar com Trump é completamente irrelevante” – Guga Chacra deixa claro que não há real disposição dos EUA para ceder. E, como era de se esperar, qualquer progresso depende unicamente do humor do magnata republicano: ele centraliza tudo e não dá autonomia aos seus auxiliares.
Uma “negociação” feita de imposições
Desde abril, vice-presidente Geraldo Alckmin, ministro Mauro Vieira (Relações Exteriores) e Fernando Haddad (Fazenda) se revezam em telefonemas, reuniões e videochamadas. Mesmo assim, nem a autoridade de um ex-governador tucano ou de dois petistas bastam para abalar a resistência de Trump. Os EUA não querem ceder e exigem troca de favores: o fim dos processos contra Jair Bolsonaro, atualmente em prisão domiciliar por tentativa de golpe – uma ofensa flagrante à nossa soberania.
“Não há negociação de fato em curso” – fonte do governo brasileiro traduz a frustração do Planalto. Os cortes pontuais anunciados pelo secretário de Comércio americano nada mais são do que migalhas cotidianas, longe de qualquer acordo robusto que reverta o prejuízo causado ao mercado interno.
Além disso, Trump condiciona qualquer avanço à interferência nos trâmites do Supremo Tribunal Federal. Se Lula for além de meras palavras e levantar a voz contra essa chantagem, corre o risco de intensificar retaliações – talvez novas sanções contra ministros da Corte.
A Casa Branca já sancionou Alexandre de Moraes sob a Lei Magnitsky e revogou vistos de outros sete magistrados. Agora flerta com mais punições. Afinal, nem mesmo a independência judicial escapa da ganância imperialista.
O Brasil não pode aceitar esse jogo de ameaça: interferir nos processos judiciais de um país soberano é atitude colonialista do século XIX. Lula tem reiterado que está pronto para diálogo, mas jamais para humilhação. E é essa postura firme que precisamos celebrar e fortalecer.
No fim das contas, a história de “bons ofícios” do Itamaraty esbarra na vaidade de Trump. Enquanto aguardamos pacientemente alguma mudança de postura dos EUA, o desafio é construir respostas nacionais à altura desse ataque: fortalecer nossas estatais, proteger produtores e trabalhar por uma política econômica que não se renda ao capital estrangeiro. Afinal, a verdadeira virada anticapitalista só ocorre quando o povo exerce o poder, e não quando se submete às chantagens do Tio Sam.