O anúncio de Donald Trump de isentar quase 700 produtos brasileiros das tarifas de 50% — mantendo para eles a alíquota de 10% já anunciada em abril — é mais um episódio do espetáculo autoritário e mercadológico que atinge o mundo, e que tem consequências concretas para trabalhadores e setores estratégicos do Brasil, como suco de laranja e aeronaves da Embraer. Enquanto a direita internacional tenta articular uma ofensiva contra governos progressistas, o recuo seletivo de Trump revela ao mesmo tempo fraqueza e malícia: ele pune politicamente Lula mas evita ferir demais a economia norte-americana que seria obrigada a engolir a alta de preços.
Taco: recuo teatral ou estratégia de intimidação?
O termo “Taco” — em inglês, Trump always chickens out — não é apenas meme de internet; foi cunhado por Robert Armstrong, colunista do Financial Times, para descrever a recorrente “amarelada” do magnata quando as ameaças viram prejuízo nos mercados. “‘Trump always chickens out’ foi a expressão criada por Robert Armstrong, colunista do Financial Times, ao analisar como investidores lucraram com os recuos de Trump”, disse Armstrong. A tática é clara: lançar um ataque, testar a reação, e depois recuar o bastante para não pagar um custo político-econômico total, mas já tendo espalhado o terror e a narrativa de força entre a direita.
O economista David Lubin, do Chatham House, expõe essa lógica com franqueza: “Claramente pode-se dizer que houve uma espécie de ‘amarelada’, porque as isenções para aeronaves, suco de laranja, ferro e petróleo pretendem limitar os danos econômicos que essas tarifas causam à economia americana”, disse David Lubin, pesquisador sênior do programa de Economia e Finanças Globais do Chatham House. Em seguida ele completa a cena política: “O presidente Trump está disposto a aceitar o custo dessa ferida autoinfligida em benefício de poder expressar sua raiva contra um antagonista político”, afirmou Lubin.
Trump quer posar de paladino dos eleitores domésticos e, ao mesmo tempo, apoiar a direita mundial — fez isso com Bolsonaro, com AfD na Alemanha e com outras alas conservadoras. Não é coincidência: a operação é política, não econômica. Não nos iludamos: essas tarifas são intimidação política, não política comercial séria. Ao mirar Lula, Trump busca agradar ao seu eleitorado e fortalecer laços com oligarquias amigas do Brasil que sonham com o retorno do bolsonarismo. E por mais que a mídia burguesa tente vender recuos como “estratégia vencedora”, toda essa pantomima tem preço real para trabalhadores, empresas e soberania nacional.
A “isenção” para quase 700 produtos diz muito: é um aceno calculado para evitar que a inflação e a escassez em setores sensíveis voltem como boomerang nos EUA. Trump visa alimentar a extrema-direita brasileira, mas está disposto a cavar sua própria cova econômica. Para um país que defende suas estatais e seu desenvolvimento soberano, a lição é óbvia: não podemos depender de jogos de poder externo nem aceitar chantagens econômicas que visam interferir na política interna.
A estratégia brasileira diante disso? Lubin sugere que reagir com bravatas só alimenta o agressor: “Para preservar a boa saúde da economia brasileira, acho que a melhor estratégia no momento seria o silêncio”, disse David Lubin. Mas silêncio não significa passividade: é momento de firmeza diplomática, de fortalecer cadeias produtivas internas, proteger estatais estratégicas e ampliar solidariedades internacionais com governos progressistas. É hora de Lula e o PT mostrarem que o Brasil é governado por um projeto popular que não se curva a chantagens de magnatas.
Trump pode recuar hoje e ameaçar amanhã. Nós, do campo do trabalho e da resistência democrática, precisamos preparar respostas que não se limitem ao teatro das concessões: defender empregos, a Embraer, o setor de alimentos e a independência nacional. Afinal, enquanto a direita global se organiza para punir quem ousa governar para a maioria, nossa tarefa é desmontar essa trama e consolidar um projeto republicano de soberania e justiça social.