A defesa dos réus apontados como o “núcleo crucial” do golpe de 2022 — entre eles Jair Bolsonaro, Alexandre Ramagem, Almir Garnier, Anderson Torres, Augusto Heleno, Mauro Cid, Paulo Sérgio Nogueira e Walter Braga Netto — apresentou ao Supremo Tribunal Federal um pacote de argumentos nas alegações finais que tenta transformar responsabilidade política e criminal em mera conversa de bastidor jurídico. Não é surpresa: quando a artilharia política falha, resta ao bolsonarismo apostar em artilharia jurídica para escapar das consequências. Não haverá trégua para a extrema-direita na luta pela defesa da democracia!
As teses centrais das defesas
As defesas buscaram, em linhas gerais, três objetivos: pedir absolvição por falta de provas ou por não configuração dos crimes; criar alternativas interpretativas para reduzir penas caso haja condenação; e evitar a soma das punições que, segundo a PGR, poderia chegar a 43 anos de prisão. Entre as estratégias mais repetidas estão a alegação de ausência ou fragilidade das provas, a distinção entre atos preparatórios e atos executórios, a tese de desistência voluntária e o questionamento sobre a aplicação simultânea de dois crimes contra a democracia — tentativa de golpe de Estado e tentativa de abolição violenta do Estado Democrático de Direito.
As peças entregues ao STF defendem, por exemplo, que as anotações apreendidas com Alexandre Ramagem seriam meras notas pessoais, incapazes de sustentar a acusação de que ele atuou para deslegitimar o sistema eletrônico de votação. Advogados de Paulo Sérgio Nogueira e Almir Garnier repetem o refrão da “fragilidade das provas”, tentando transformar um longo mosaico de condutas coordenadas em episódios isolados e inocentes. Mas não podemos esquecer que a PGR descreve um plano com atores centrais que articulavam medidas para manter o presidente fora da vontade popular expressa nas urnas.
No debate sobre atos preparatórios versus executórios, há quem diga que reuniões, lives, planos e monitoramentos seriam apenas preparo — e, portanto, atípicos penalmente. Essa visão é conveniente para quem pretende naturalizar conspirações como mera “discussão de estratégia”. A acusação, por sua vez, sustenta que muitas dessas ações tinham potencial concreto de ruptura institucional, com ameaças de violência e instrumentos práticos para efetivar um golpe. A justiça não pode se dobrar ao espetáculo jurídico montado pela gangue golpista.
Outros pontos sensíveis: a tentativa de evitar a configuração de organização criminosa armada, a contestação de ligação direta com os atos de 8 de janeiro e a alegação de que não se pode aplicar cumulativamente as acusações por golpe e abolição do Estado Democrático de Direito, pois uma implicaria a outra. A PGR rebate que os crimes são autônomos e que as condutas tiveram autonomia suficiente para justificar a soma das penas. Bolsonaro, por sua vez, tenta usar a tese da desistência voluntária — diz que recuou de medidas como estado de defesa ou de sítio —, argumento que soa mais como desculpa de quem foi derrotado politicamente do que como renúncia responsável.
Do ponto de vista político, é claro: estas defesas não estão apenas debatendo tecnicalidades legais. Buscam limpar a biografia de uma extrema-direita que tentou destruir instituições e intimidar a própria vontade popular. Para nós, que acreditamos na construção de um projeto popular e anticapitalista liderado por forças como Lula e o PT, a derrota dessas investidas é fundamental. O processo no STF é palco de uma batalha não só jurídica, mas também política: é a hora de reafirmar que ataques às instituições serão punidos e que a esquerda precisa transformar essa vitória institucional em avanço social e destruição dos polos oligárquicos que financiam o bolsonarismo.
A defesa jurídica pode tentar minar provas e apelar a interpretações benévolas, mas a história e a memória política não se dobram a manobras. Cabe ao tribunal e à sociedade decidir se aceitaremos que uma tentativa de golpe seja tratada como mera trama retórica ou se, finalmente, consolidaremos a resposta necessária para que episódios como 2022 não voltem a ameaçar a democracia brasileira.