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Senado publica regras para IA, mas gabinetes parlamentares podem ignorar normas

O Senado publicou um normativo sobre o uso de inteligência artificial que, à primeira vista, parece bonitinho: respeito aos direitos fundamentais, supervisão humana, proteção de dados, transparência. Mas quem lê com atenção percebe que é documento para inglês ver — uma maquiagem institucional que cai por terra quando lembramos que gabinetes parlamentares podem simplesmente não aderir. Ou seja: regras só para quem aceita seguir regras. Não é reforma, é jabuticaba normativa!

O que o normativo diz

O texto assinado pela diretora‑geral Ilana Trombka traz uma lista de princípios que qualquer pessoa minimamente preocupada com democracia e direitos já apoiaria — até quem não gosta de direitos! Entre os fundamentos, aparecem: respeito aos direitos fundamentais e à centralidade da pessoa humana; promoção do bem‑estar social; fomento à inovação; supervisão humana em todas as etapas; promoção da igualdade; gestão de riscos; proteção de dados pessoais; uso preferencial de dados públicos e auditáveis; capacitação contínua; segurança da informação; e transparência sobre auditorias e impactos. Um rol bonito de intenções que pode virar papel molhado se não houver fiscalização forte.

O regulamento também exige que os sistemas de IA sejam usados de forma “ética” e “responsável”, que não se usem dados protegidos ou pessoais sem autorização e que fique sempre claro quando ferramentas automatizadas estão sendo empregadas. Importante: todas as decisões automatizadas devem ser revistas e validadas por um servidor da casa. E, para o desenvolvimento dos sistemas, o texto reforça a necessidade de mitigar vieses discriminatórios e documentar todo o processo de criação — desde a seleção dos dados até os eventuais riscos e medidas mitigatórias. “A utilização de dados para o desenvolvimento de projetos de IA deve observar as melhores práticas de governança de dados, considerando qualidade, integridade e segurança dos dados, de acordo com as normas e legislação vigentes”, justificou o texto do normativo assinado pela diretora‑geral Ilana Trombka.

Por que isso é insuficiente — e perigoso

A grande falha? A possibilidade de gabinetes se eximirem das regras. Imagine a cena: um senador aliado ao bolsonarismo ou aos interesses privatistas decide usar IA para manipular narratives, microsegmentar eleitores, automatizar perseguições ou simplesmente terceirizar decisões para empresas privadas sem qualquer transparência. Se esse gabinete se recusa a aderir, pronto: a norma vira teatro. Como garantir direitos quando a própria casa cria uma exceção para quem não quer cumprir?

Além disso, palavras como “ética” e “responsabilidade” são adoradas por quem lucra com tecnologia e pelo mercado financeiro que financia plataformas privadas. Sem mecanismo robusto de controle público, orçamentos abertos, auditorias independentes com participação da sociedade e proibição clara de contratos que entreguem dados sensíveis a corporações, teremos mais privatização de decisões públicas e menos democracia. E quem sai ganhando? Bilionários de direita e empresas de tecnologia que vivem de explorar dados e influenciar comportamentos.

Nós, que lutamos por um projeto popular e soberano, não podemos aceitar que o tema seja tratado com meias medidas. O Estado deve liderar a pesquisa e o desenvolvimento de IA com controle público, garantindo que os sistemas sirvam ao interesse coletivo e não ao lucro. É papel do governo, e em especial das lideranças progressistas como Lula e o PT, avançar de modo a transformar essas intenções em políticas concretas: investimento em estatais tecnológicas, conselhos com participação da sociedade, e legislação que impeça o uso corporativo e eleitoral abusivo de IAs.

A democracia não se preserva com comunicados bonitos e brechas legais. Ou enfrentamos o processo de frente — construindo mecanismos reais de controle social, transparência e soberania tecnológica — ou veremos a inteligência artificial ser usada como instrumento de concentração de poder e de expulsão popular das decisões públicas. Quem tem saudade do Estado mínimo e dos entregadores do país aos bilionários neoliberais que se cuide: a tecnologia pode ser arma deles, mas também pode ser ferramenta da classe trabalhadora — se tivermos coragem de disputar essa disputa política.

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