O ex-assessor de Bolsonaro Marcelo Câmara, agora preso pela Polícia Federal, será levado ao Supremo Tribunal Federal para uma acareação que promete expor mais um capítulo da tentativa de golpe que sacudiu o país. Nesta quarta-feira (13), Câmara ficará frente a frente com o tenente-coronel Mauro Cid, outro personagem chave da trama golpista. É hora de colocar as contradições no espelho da Justiça e mostrar, sem verniz nem cortina de fumaça, quem eram os operadores do retrocesso democrático no governo bolsonarista.
Núcleo de gerenciamento de ações
A Procuradoria-Geral da República aponta Marcelo Câmara como integrante do chamado “núcleo de gerenciamento de ações” — o grupo que coordenou manobras sujas para tentar subverter o resultado da eleição de 2022. Entre as práticas que a PGR atribui a esse núcleo estão o uso da Polícia Rodoviária Federal para atrapalhar o voto de eleitores de Lula, a confecção de uma minuta de decreto golpista e até o planejamento de assassinatos de autoridades. Não é teoria da conspiração; são acusações que envolvem nomes e estruturas estatais usadas contra a própria democracia. É o projeto autoritário disfarçado de ordem pública, usando farda e chancela estatal para cumprir interesses políticos.
Além de Câmara, respondem na ação: Silvinei Vasques (ex-diretor-geral da PRF), Marília Ferreira de Alencar (ex-diretora de Inteligência do Ministério da Justiça na gestão Anderson Torres), Fernando de Sousa Oliveira (delegado da PF e ex-secretário-executivo da SSP), Mário Fernandes (ex-número dois da Secretaria-Geral da Presidência e general da reserva), e Filipe Garcia Martins Pereira (ex-assessor internacional de Bolsonaro). Quando você desenha a linha do golpe, ela passa por muitos gabinetes e por cima do serviço público: não é falha institucional, é projeto político!
O que precisa ser esclarecido?
A acareação foi determinada pelo ministro Alexandre de Moraes, atendendo a pedido da defesa de Marcelo Câmara para confrontar versões e esclarecer contradições apontadas nos depoimentos. Mauro Cid, que já virou peça central em outros capítulos da investigação, disse que Câmara teria acessado e manipulado minutas golpistas apresentadas no Palácio da Alvorada; que monitorou continuamente o ministro Alexandre de Moraes e a chapa eleita Lula-Alckmin; e que tinha conhecimento dos motivos desse monitoramento, incluindo ligação com o hacker conhecido como Rafael Martins de Oliveira, o chamado “kid preto”. Cabe agora ao STF forçar respostas claras, sem rodeios ou encobrimentos aparentes.
Câmara irá à acareação presencialmente, usando tornozeleira eletrônica e impedido de falar com quem não seja seu advogado. Medida mínima diante da gravidade das imputações. Cid já havia participado de acareações em junho — inclusive uma com o general Walter Braga Netto, que chamou o ex-ajudante de ordens de mentiroso. “Cid é mentiroso”, disse o general Walter Souza Braga Netto. Além disso, a Polícia Federal confirma que “Cid firmou acordo de colaboração premiada com a Polícia Federal em 2023”, o que o coloca numa posição ambígua: réu e colaborador ao mesmo tempo, com informação que pode desmontar redes.
As acareações são ferramentas legais para arrancar contradições e forçar que histórias se alinhem com fatos — ou que se desmascarem definitivamente. Não se trata de espetáculo: trata-se de responsabilizar quem usou cargos públicos e instituições para planejar a ruptura do regime democrático.
A luta contra o bolsonarismo e suas ramificações não acaba numa prisão ou numa manchete. É preciso aprofundar a investigação, desmontar as organizações que usaram o Estado para fins autoritários e garantir que o aparato público retorne ao serviço do povo. Lula e o PT, além de instrumentos eleitorais, têm agora a responsabilidade histórica de transformar essa vitória legal em avanço social e institucional — de reconstruir estatais, revogar privatizações que serviram à elite e enfrentar os bilionários que financiaram a máquina do retrocesso. A acareação é um passo; a reconstrução democrática e social exige mobilização e coragem política.