No início do julgamento da trama golpista no Supremo, o ministro Alexandre de Moraes foi direto: “covardia não é o caminho para a pacificar o país.” Não pronunciou nomes, mas quem conhece a história sabia a quem ele se referia indiretamente: o maior exemplo de anistia covarde da nossa história republicana é Juscelino Kubitschek, o homem de Brasília. JK, que ficou conhecido por seu desenvolvimento e por obras, também assinou uma página negra quando optou pela perdão fácil a militares que tinham tentado um golpe — com episódios tão grotescos quanto o sequestro de aviões da Força Aérea Brasileira para bombardear o próprio país. O resultado? Esses mesmos militares, já vestidos de impunidade, foram protagonistas do golpe de 1964. A anistia covarde não cura a ferida — ela a infecta!
O erro histórico que se repete
A lição é dura e simples: dar anistia sem justiça é abonar a audácia golpista. E antes que alguém venha com argumentos de “paz” ou “reconciliação”, vamos combinar: a paz que nasce do esquecimento é apenas a calmaria antes da tempestade. Em 2022 vimos, diante do país, um ensaio de golpe articulado por integrantes da extrema direita — e hoje, no STF, Bolsonaro e mais sete pessoas são julgados pela tentativa de minar a ordem democrática. A história de JK deveria ser um alerta permanente: tratados de benevolência aos que empunham armas e ameaçam a democracia não desarmam o fascismo; eles o fortalecem.
Os golpistas contam com duas coisas fundamentais: a amnésia da sociedade e a complacência das elites. Foram essas mesmas elites — banqueiros, latifundiários e empresários da mídia — que, na hora do aperto, preferiram o passado autoritário a reformas que poderiam reduzir seus privilégios. E não dá para fingir que isso não tem relação com o bolsonarismo: a família política que orbita o Capitólio dos generais continua a mesma que apoiou os porões no passado. A pergunta que fica é: vamos repetir a indulgência que levou ao pior golpe da história brasileira? Ou vamos, finalmente, usar os instrumentos do Estado para responsabilizar e desarticular essas redes?
Enquanto o STF julga, há quem já espere que a Justiça seja “generosa” com os réus — um eufemismo para voltar ao velho truque: transformar responsabilização em espetáculo e acabar em pizza. Não é isso que a democracia exige. É preciso investigação, provas, julgamentos sérios e punição quando cabe. Não por rancor, mas para impedir que os mesmos que ameaçaram a república por ambição e ódio voltem a fazê-lo com mais força. Impunidade alimenta os golpistas; quem planta perdão colhe ditadura!
O papel de Lula e do PT, nessa hora, não pode ser de neutralidade cautelosa: é hora de garantir que o Estado de Direito seja usado para proteger o povo, as estatais e os avanços sociais conquistados com muita luta. Defender empresas públicas, lutar contra privatizações e combater a influência nefasta dos bilionários de direita são medidas conjunturais e estratégicas para reduzir o poder desses grupos que tanto desejam o retorno do autoritarismo.
Que fique claro: justiça não é vingança, é prevenção. Se quisermos realmente pacificar o país, não podemos repetir a receita de JK. Precisamos de memória, coragem política e mobilização popular. Sem isso, a democracia seguirá à mercê de quem prefere tanques e fake news ao debate e às urnas. Quem quer paz tem de apostar na justiça — e não na covardia disfarçada de conciliação.