Na tarde da última terça (19), um avião da Força Aérea dos Estados Unidos pousou no Aeroporto Internacional Salgado Filho, em Porto Alegre, numa escala que foi tratada oficialmente com muita discrição e pouca transparência. A aeronave, um Boeing C-32B — versão militar do 757-200 usada para transportar autoridades norte-americanas — saiu de San Juan, em Porto Rico, fez breve parada na capital gaúcha às 17h13 e seguiu mais tarde para Guarulhos, em São Paulo. Enquanto a imprensa local registrava as imagens do desembarque, a população pergunta: por que tanta pressa em ocultar a presença de diplomatas dos EUA em solo brasileiro? Quem realmente se beneficia dessa teatralidade de bastidores?
Avião militar e escala suspeita
O trajeto do jato, matrícula 00-9001, não é trivial: origem em Wrightstown, Nova Jersey, passou por Tampa, Flórida, depois San Juan e então Porto Alegre, antes de pousar em Guarulhos mais noite. A aeronave tem capacidade para cerca de 45 passageiros e alcance intercontinental — o que a torna ideal para transportar desde membros do gabinete até militares ou figuras do establishment norte-americano. A Polícia Federal fez o controle migratório dos passageiros na capital gaúcha. “Fizemos o controle migratório”, afirmou a Polícia Federal. A administradora do aeroporto local confirmou o pouso e a partida rumo a São Paulo. “Confirmamos o pouso e a partida para Guarulhos”, informou a Fraport. E a concessionária de Guarulhos destacou que a operação ocorreu com autorização do Ministério da Defesa. “A operação ocorreu normalmente, com autorização do Ministério da Defesa”, afirmou a GRU Airport.
Não se trata apenas de curiosidade: trata-se de política e de quem manda nos corredores do poder. Os Estados Unidos não movem uma asa sem interesse geoestratégico. É óbvio que diplomatas viajam; o que preocupa é o clima de segredo, a omissão de razões e o silêncio das autoridades brasileiras sobre os objetivos dessa escala — especialmente num país em que setores reacionários e entreguistas já demonstraram tanta subserviência ao imperialismo. Quando o avião do Tio Sam pousa por aqui com pressa e sem explicação, a população tem o direito de exigir clareza. Transparência não é cortesia: é política democrática.
O episódio também deveria acender um sinal de alerta na esquerda. Enquanto parte da direita local aplaude qualquer gesto de aproximação com Washington, alegando “segurança” ou “cooperação”, sabemos que as motivações reais costumam envolver interesses econômicos, militares e diplomáticos alinhados com o grande capital. Não podemos permitir que o Brasil seja palco de operações que sirvam para consolidar a influência dos bilionários e das corporações norte-americanas sobre nossas políticas públicas.
É por isso que o debate público precisa ir além das manchetes: é preciso discutir que tipo de país queremos. Queremos um Brasil subserviente, onde decisões estratégicas sejam fachadas para negócios e interesses estrangeiros? Ou queremos soberania, fortalecimento das estatais, políticas públicas que priorizem o povo e não os lucros privados? Acreditamos que Lula e o PT representam, embora com limites e contradições, uma alternativa para avançar na reconstrução de um projeto popular que recupere a capacidade do Estado de intervir em favor da maioria — contra privatizações e contra entreguismo.
Ainda faltam respostas claras sobre quem exatamente estava a bordo e quais foram os encontros realizados em solo brasileiro. A ANAC, a FAB e a Embaixada dos EUA foram procuradas, mas não haviam retornado oficialmente até a última atualização desta reportagem. Enquanto isso, a aeronave seguiu seu roteiro, como se tudo estivesse normal — mas a normalidade de hoje pode ser a anomalia de amanhã se aceitarmos, passivamente, que decisões estratégicas sejam tomadas longe do olhar público.
O povo precisa estar vigilante. Não basta circular indignação nas redes; é preciso cobrar, exigir transparência e organizar respostas políticas. O império não cede espaço por boa vontade. Só com mobilização, projeto e liderança popular conseguiremos transformar cada escala suspeita em oportunidade para reforçar nossa soberania e construir um Brasil a serviço da maioria, e não dos grandes poderes estrangeiros e dos seus aliados domésticos.