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Benefícios fiscais do governo têm em 2024 a primeira queda em quatro anos, mas incidem privilégios que mantêm desigualdades

O Ministério do Planejamento acabou de divulgar números que, à primeira vista, parecem razão para festejar: os benefícios fiscais, financeiros e creditícios somaram R$ 678 bilhões em 2024 — o equivalente a 5,78% do PIB — uma leve queda ante os 6,1% de 2023. Mas antes que a direita comemore qualquer “ajuste responsável”, é preciso entender o jogo político por trás dos números e o que realmente está em disputa na distribuição desses subsídios. Não é sobre austeridade técnica: é sobre escolhas de classe.

“Essa redução é importante por consolidar a quebra da tendência de expansão observada desde 2020”, disse o Ministério do Planejamento — frase que muitos usarão para arvorar-se em paladinos do equilíbrio fiscal. Mas atenção: a queda não resolveu o rombo. Em 2024 o governo registrou déficit de R$ 43 bilhões (0,36% do PIB) e a meta oficial é zerar o déficit neste ano. Ainda assim, o próprio governo admite que exceções à meta, como precatórios e as medidas para setores atingidos pelo tarifaço, podem manter as contas no vermelho até o fim do mandato de Lula.

Os dados mostram redução nos gastos tributários e nos benefícios creditícios, ao mesmo tempo em que houve aumento dos subsídios financeiros — ou seja, a União assumindo dívidas por conta de interesses e pressões. Os subsídios tributários dominam o bolo: representam mais de 83% do total. Entre eles, o Simples Nacional (17,4%), apoio à agricultura e agroindústria (11,4%) e a não tributação de rendimentos de pessoas físicas (14,2% em isenções e deduções). Ou seja: grande parte do “sacrifício” anunciado não mexe com as estruturas que beneficiam grandes setores econômicos e camadas abastadas.

Nos últimos anos, o governo teve de negociar com o Congresso o fim progressivo da desoneração da folha para 17 setores, e em 2025 acabou o benefício do setor de eventos (Perse). Ao mesmo tempo, a equipe econômica propõe medidas que ampliam benefícios para a classe média — como a isenção do IR para rendas até R$ 5 mil (proposta que beneficiaria 10 milhões de pessoas num ano eleitoral) e alívios parciais até R$ 7 mil. Para compensar, querem taxar os muito ricos: quem ganha mais de R$ 50 mil por mês (R$ 600 mil/ano) seria alvo da nova taxação. Medida correta e justa, que deveria ir mais longe e mirar os bilionários que mandam no país, não apenas a pontinha do topo.

“A PEC Emergencial prevê reduzir os benefícios fiscais pela metade, para 2% do PIB, em até oito anos”, lembrou a ministra do Planejamento, Simone Tebet, em audiência no Senado — observando, porém, que parte desses gastos está blindada pela reforma do consumo aprovada em 2023. Resultado: 52,7% dos benefícios tributários têm de ser preservados por lei. Ou seja, metade do problema fica intocável por amarras políticas que protegem interesses instalados.

O que pode ser cortado?

A lista de possíveis alvos é conhecida: deduções para pessoas físicas, incentivos ao setor automotivo e outros privilégios que beneficiam tanto empresas quanto famílias de renda média-alta. Mas o que está em jogo é estratégico: cortar o que serve ao capital concentrado e aos seus lobbies significa enfrentar resistências ferozes no Congresso e na mídia oligárquica. Não é por acaso que medidas de taxação dos super-ricos são tratadas com cautela enquanto governos acenam com “proteção à classe média”.

O debate que precisamos travar é claro: ou se enfrenta a estrutura de privilégios que mantém um modelo econômico excludente — com empresas e grandes latifundiários recebendo generosas desonerações — ou se promete ajuste que, no fim, aperta sempre os de baixo. Lula e o PT, apesar das limitações do jogo institucional, apresentaram escolhas no sentido de proteger direitos e retomar protagonismo do Estado — o que deve ser ampliado, radicalizado, e não diluído em concessões aos poderosos.

A pergunta que fica para a militância democrática e de esquerda é direta: vamos aceitar que metade dos benefícios permaneça intocada para salvar lucros e fortunas, ou vamos empurrar a disputa para além das fórmulas contábeis e exigir tributação justa, fortalecimento das estatais e fim das renúncias fiscais que sustentam privilégios? A hora é de pressão política nas ruas e no Parlamento — sem medo de enfrentar a direita e seus defensores de gravata.

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