A CPI do INSS voltou a mostrar que o Brasil tem um problema estrutural: enquanto aposentados e pensionistas veem seus direitos diluídos, operadores e laranjas continuam a transformar a Previdência numa máquina de privilégios. Nesta quinta-feira (4), o presidente da comissão, senador Carlos Viana (Podemos-MG), informou que pediu à polícia legislativa a intimação de Antônio Carlos Camilo Antunes, o conhecido “Careca do INSS”, que teria ignorado convocações para prestar esclarecimentos. A situação expõe não apenas um esquema de fraudes bilionárias, mas também a lentidão — e por vezes a cumplicidade — das engrenagens que deveriam proteger os mais vulneráveis.
Figura central
A Polícia Federal aponta o “Careca” como o principal operador do esquema de desvio de recursos das aposentadorias e pensões. Segundo as investigações, empresas ligadas a ele funcionariam como intermediárias para entidades que fraudavam benefícios do INSS. Além de Antônio Carlos Camilo Antunes, a CPI também pediu a intimação de Maurício Camisotti, apontado como sócio oculto em uma das entidades e beneficiário das fraudes. Na semana passada, a comissão aprovou pedido de prisão preventiva e quebra de sigilo para ambos — medidas que foram encaminhadas à Polícia Federal, que por sua vez precisa da autorização da Justiça para executar as prisões.
“Nós buscamos primeiramente contato com os advogados de defesa para que eles pudessem marcar, inclusive, o dia que viriam. Mas como os advogados também não responderam, a intimação foi enviada por meio policial”, — senador Carlos Viana (Podemos-MG). E, como quem assiste a cena esperando que a alguma mudança profunda aconteça por milagre, Viana ainda complementou: “Nós estamos aguardando, naturalmente, que a polícia nos responda se já foi efetivada essa comunicação”, — senador Carlos Viana (Podemos-MG).
É revoltante ver a norma sendo acionada apenas quando a exposição pública é grande o suficiente. Enquanto isso, beneficiários seguem sem respostas e com pagamentos corroídos por fraudes que parecem prosperar sob o olhar indiferente de muitos responsáveis.
O relator da CPI, deputado Alfredo Gaspar (União-AL), fundamentou o pedido de prisão preventiva na ausência de medidas de prisão até o momento para os envolvidos no que a PF chama de desvio bilionário. Em outras palavras: havia tempo e razões suficientes para medidas mais duras antes da escalada pública do escândalo. A burocracia judicial, a morosidade policial e a falta de vontade política conspiram para que órgãos públicos se tornem celeiros de negociatas.
Próximos depoimentos
A comissão também marcou oitiva de dois ex-ministros da Previdência. Carlos Lupi, que estava no cargo quando o escândalo veio à tona, confirmou presença na segunda-feira (8) às 16h. O ex-ministro do governo Jair Bolsonaro, José Carlos Oliveira, foi convocado para quinta-feira (11). Ambos são convidados, ou seja, têm a opção de aceitar ou não o chamado da CPI — uma faculdade que muitas vezes funciona como proteção adicional para atores que preferem o silêncio à exposição.
Se a democracia cobra transparência, por que tantos se escondem atrás de artifícios legais e burocráticos? Pergunta retórica, claro — sabemos a resposta: interesses escusos e redes de proteção políticas que atravessam governos, partidos e administrações.
É urgente que a CPI não se contente com espetáculo midiático. Acionar a polícia legislativa é necessário, mas não suficiente. Exigir que a Justiça acelere decisões, garantir proteção às testemunhas e aprofundar o rastreamento financeiro são passos indispensáveis para resgatar o que foi sacado das mãos de quem mais precisa. E mais: é tarefa do movimento popular e da esquerda pressionar não só por punição, mas por um projeto de recuperação do Estado e fortalecimento das estatais que garantam serviços públicos eficientes e insusceptíveis ao saque privatista.
A direita que chama de “estatalismo” o que é proteção social não tem moral para falar. E os defensores do desastre neoliberal, que entregaram pedaços do Estado a privatarias e compadrio, devem responder politicamente por essa barbárie. A CPI pode ser um passo — que seja aproveitado para avançar numa agenda que defenda a Previdência pública, puna os culpados e reinvista nas vidas dos trabalhadores. Que não fiquemos apenas com nomes vindos à tona; que venhamos a conhecer as ligações, os fluxos e, sobretudo, as responsabilidades políticas por trás desse assalto. Quem protege os saqueadores deve ser lembrado nas urnas e na história.