A articulação em torno de uma possível migração de Tarcísio de Freitas do Republicanos para o PL é mais do que um jogo de cadeiras partidárias: é o espelho da crise da extrema-direita que tenta sobreviver sem Bolsonaro e da ambição das máquinas tradicionais da direita em ter um novo poster boy nacional. Aliados do governador de São Paulo deixam claro que a decisão dependerá do plano para 2026 — se for disputar a presidência, a sinalização é de filiação ao PL; se optar pela reeleição, tende a permanecer no Republicanos, onde já tem capital político e menor exposição direta ao clã bolsonarista.
A dança das cadeiras e os recados da elite
A pressão vinda de Valdemar Costa Neto, presidente do PL, não foi sutil. “Se Tarcísio for candidato a presidente, irá para o PL”, disse Valdemar Costa Neto durante evento para políticos e empresários em São Paulo. Do outro lado, na celebração dos 20 anos do Republicanos, o presidente Marcos Pereira tratou de reafirmar a resistência interna: “Se a conjuntura dos acontecimentos permitir, teremos um candidato a presidente da República. Não é, Tarcísio?” afirmou Marcos Pereira. Entre as duas falas, desenha-se uma disputa de influência: o PL quer o nome para montar palanques e caixa, o Republicanos quer manter sua estrela e evitar virar anexo.
A direita brasileira se esfarela entre ambições pessoais e o legado tóxico do bolsonarismo. Valdemar e seus aliados articulam a migração aproveitando a inelegibilidade de Jair Bolsonaro, enquanto o clã Bolsonaro reage com ciúme e ameaça de rachar legendas — como evidenciado pelo recado ácido de Carlos Bolsonaro: “se comportam como ratos” que só querem “herdar o espólio de Bolsonaro”, disse o vereador carioca, criticando governadores de direita sem citar nomes.
Tarcísio, por sua vez, mantém um discurso dúbio: publica foco na reeleição, mas adota tom presidencial em eventos, defendendo reduzir ministérios e prometendo, pasmem, “fazer 40 anos em 4” — um sintoma clássico de quem se prepara para pegar carona no sentimento conservador nacional. Segundo relato da imprensa, até o presidente Lula reagiu ao movimento: “Acredito que Tarcísio será o candidato da oposição em 2026”, afirmou o presidente Lula, segundo reportaram Guilherme Balza, Guilherme Mazui e Isabella Calzolari, da GloboNews e do g1.
Há também tensão interna entre bolsonaristas: Paulo Figueiredo, aliado de Eduardo Bolsonaro, avisou a Bela Megale, do jornal O Globo, sobre um possível êxodo caso Tarcísio vá para o PL: “Caso Tarcísio migre para o PL, o deputado deixará o partido e irá para outra legenda para ser candidato a presidente”, disse Paulo Figueiredo. Traduzindo: a direita clássica de Valdemar teme perder controle sobre as alas mais radicais, e as arestas internas podem produzir mais divisões do que unidade.
No plano estadual, a pesquisa Quaest mostrou Tarcísio com 43% das intenções de voto para o governo de SP, seguido por Geraldo Alckmin com 21% e Erika Hilton com 8% — números que alimentam o dilema: arriscar a escalada nacional agora ou consolidar poder local para disputar mais adiante. O PL já comanda a Assembleia Legislativa e tem aliados como André do Prado no comando da Casa; o Republicanos, por sua vez, ostenta Tarcísio como “grande estrela” e quer manter o distanciamento do desgaste bolsonarista.
Enquanto a direita se esgarça, o campo progressista tem a responsabilidade de transformar a derrota do bolsonarismo em avanço real de políticas populares e estatais. Lula e o PT, mais do que gestores eleitorais, devem ser o motor de uma nova etapa de luta anticapitalista — não apenas para barrar retrocessos, mas para recolocar estatais, serviços públicos e justiça social no centro do debate.
O calendário manda: se decidir concorrer à Presidência, Tarcísio teria de deixar o Palácio dos Bandeirantes seis meses antes da eleição; Valdemar garante que a decisão sairá até dezembro. Até lá, a disputa interna, as pesquisas e os recados públicos vão sendo instrumentos de pressão e negociação. E enquanto os mafiosos de gravata trocam juras de lealdade e chantagem, a tarefa da esquerda é clara: não apenas vigiar as movimentações da direita, mas aproveitar suas fissuras para construir um projeto popular que não dependa do jogo de cadeiras dos poderosos.