A defesa de Jair Bolsonaro enviou nesta segunda-feira (18) ao ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF), documentos médicos que comprovam que o ex-presidente compareceu ao hospital no último sábado (16). Foi essa apresentação do atestado de comparecimento —exigida por Moraes— que permitiu a saída temporária da prisão domiciliar para a realização dos exames. O episódio, além de exibir mais um capítulo do show midiático e jurídico que cerca o bolsonarismo, revela também como as brechas e privilégios continuam sendo negociados na ponta da faca institucional deste país.
No sábado, Bolsonaro deixou a prisão domiciliar para fazer exames no Hospital DF Star, unidade privada em Brasília: coleta de sangue e urina, endoscopia e tomografia abdominal. A defesa encaminou os comprovantes ao ministro responsável pelo processo. Em linguagem clínica e burocrática, os laudos descrevem o que os médicos identificaram e as recomendações para acompanhamento.
Exames e laudo médico
“Os exames fazem parte de uma investigação de quadro recente de febre, tosse, persistência de episódios de refluxo gastro-esofágico e soluços”, informou a equipe médica, segundo os documentos. O relatório aponta imagens residuais de duas infecções pulmonares recentes possivelmente relacionadas a episódios de broncoaspiração, além da persistência de esofagite e gastrite, hoje menos intensas, mas que exigem tratamento contínuo. “Deverá seguir com o tratamento da hipertensão arterial, da doença aterosclerótica das artérias carótidas e artérias coronárias, da dislipidemia e do quadro de refluxo e esofagite, com medidas preventivas de broncoaspiração”, registrou o atestado médico.
Os termos técnicos não impedem que a cena política soe como espetáculo: um ex-presidente que desafia decisões judiciais, recebe tratamento em clínica privada e tem sua saída autorizada mediante documentação formal. Tudo isso enquanto a direita que ele representa segue atacando o serviço público, vendendo estatais e privatizando a saúde como se fosse mercadoria de luxo.
O ex-presidente está preso em casa desde o dia 4 de agosto por descumprimento de decisões judiciais. Essa condição legal não o colocou fora do centro da controvérsia: ao contrário, cada movimento médico-judicial vira munição para narrativas de impunidade ou de perseguição —dependendo do ângulo conveniente aos militantes de plantão.
Se é verdade que qualquer cidadão tem direito a cuidados médicos, também é verdade que o tratamento do caso Bolsonaro expõe uma desigualdade estrutural. Enquanto milhões dependem do SUS —e veem cortes, terceirizações e tentativa de privatização avançarem—, o tratamento de luxo de figuras públicas demonstram a prioridade da elite: manter privilégios e burlar regras quando convém.
Como jornalista e militante, não posso deixar de apontar que a luta não é apenas contra indivíduos, mas contra um projeto de sociedade que naturaliza privilégios e protege bilionários e corruptos. O bolsonarismo é isso: um conjunto de arranjos para proteger a direita no poder e relativizar a lei. Por outro lado, é imprescindível reconhecer que forças populares e o PT colocaram o debate sobre direitos e soberania no centro da disputa. Lula e o PT não são a panaceia, mas têm sido protagonistas necessários para abrir espaço político a uma nova etapa de luta anticapitalista no país —e isso passa por defender o SUS, reestatizar onde for preciso e desmontar a ofensiva privatista.
Restará aos movimentos sociais, à esquerda e às majorias populares transformar a indignação com episódios como esse em política concreta: mais transparência, fim de privilégios judiciais e oposição firme às privatizações que empobrecem nossa saúde pública. Só assim venceremos a combinação venenosa de impunidade e mercado que a direita tanto cultiva.