A Polícia Federal recuperou áudios no celular de Jair Bolsonaro que mais parecem um roteiro de comédia de má qualidade — se não fossem as implicações criminais e o ódio às instituições democráticas. As trocas entre o ex-presidente, seu filho Eduardo e o pastor Silas Malafaia, agora parte do inquérito que levou ao indiciamento de Bolsonaro e de seu primogênito, expõem a jardinagem suja do bolsonarismo: articulações com embaixadas, disputa por interlocução com o governo dos EUA e uma disputa interna por poder que cheira a nepotismo e a chantagem. Malafaia virou alvo de buscas; a turma da família se descabela enquanto tenta controlar quem conversa com quem lá fora — e para quê.
“Você podia até defender Tarcísio. Porque foi você que mandou Tarcísio na embaixada” — Silas Malafaia. Esse é o tipo de frase que desmonta o teatro da direita: indica quem puxou o fio, quem serviu de ponte e como as negociações de escopo internacional eram tocadas por redes paralelas. Bolsonaro, no áudio, responde com o desprezo habitual: “Não adianta um outro governador querer ir para os Estados Unidos, ir pra embaixada, para não sei onde quer que ele vá, tentar sensibilizar. Não vai conseguir” — Jair Bolsonaro. Tradução? Só o núcleo duro da família e de seus apaniguados teria acesso às portas que abrem privilégios — e qualquer intruso seria sumariamente rechaçado.
E lá vem Eduardo, com aquela mistura de arrogância e ressentimento de quem acha que nasceu para ser o único emissário do clã: “Se quiser acessar a Casa Branca, não conseguirá. Só eu e Paulo Figueiredo temos acesso (sic)” — Eduardo Bolsonaro. Ah, a democracia terceirizada para a Faria Lima e para os contatos privados — que novidade! O bolsonarismo nunca teve vergonha de transformar o Estado em cabide de privilégios para seus amigos e em família. Para a Polícia Federal, essas mensagens “evidenciam” que Eduardo queria se colocar como “único interlocutor” com o governo norte-americano para “garantir o êxito das ações criminosas de coação às autoridades brasileiras” — Polícia Federal. Pois é: não é teoria da conspiração quando os próprios protagonistas deixam o rastro.
A situação se agrava com as críticas internas, sem qualquer pudor. Eduardo ainda dispara contra Tarcísio de Freitas, governador de São Paulo, com o cinismo de quem confunde agressividade com poder político: “Só para te deixar ciente: Tarcísio nunca te ajudou em nada no STF. Sempre esteve de braço cruzado vendo vc se fuder e se aquecendo para 2026” — Eduardo Bolsonaro. E, num momento de escárnio que mistura ambição e desespero, o filho ameaça um futuro de fuga: “Sabe que vai cair tudo na sua conta, né? Futuro dos seus netos é falar inglês mesmo” — Eduardo Bolsonaro. Dá para imaginar o pânico: quando a casa desaba, os herdeiros pensam primeiro em passaporte.
Enquanto isso, a direita mostra o seu rosto verdadeiro: disputa por espólio público, patrimonialismo e alianças sombrias com interesses externos. Essas gravações desmontam a narrativa de que o bolsonarismo é uma reação popular espontânea; é, sobretudo, uma estrutura predatória que busca privatizar o acesso ao poder e às decisões do Estado. E, claro, tudo isso acontece sob o silêncio cúmplice de pastores, empresários e operadores que transformam política em mercado privado.
O caso joga luz sobre dois fatos políticos centrais: primeiro, como as elites de direita operam em redes paralelas, tentando negociar tarifas, influências e favores fora dos canais democráticos; segundo, como a disputa entre caciques do campo conservador pode se tornar arma para investigações e rupturas internas. Para nós, que lutamos por uma verdadeira ruptura com essa ordem, esses áudios são combustível para a mobilização democrática e para a denúncia implacável do bolsonarismo e seus cúmplices.
Se a direita acha que a solução é briga de bastidores e interlocução secreta com potências estrangeiras, que fique claro: precisamos desmantelar politicamente essa estrutura e avançar na construção de um projeto popular que recupere o Estado para a sociedade — fortalecendo estatais, barrando privatizações e expandindo direitos. Lula e o PT não são meros instrumentos eleitorais; são, neste momento, peças centrais para reorganizar a resistência e abrir espaço para uma nova etapa da luta anticapitalista no Brasil. A hora é de enfrentar quem quer transformar o país em quintal de negociatas — e de transformar cada áudio comprometedora em prova pública e motivo de mobilização nas ruas!