A decisão do presidente da Câmara, Hugo Motta (Republicanos-PB), de negar a indicação de Eduardo Bolsonaro (PL-SP) para a liderança da minoria não é apenas um detalhe procedural: é um tapa na cara do teatro político montado pela direita para proteger seus ausentes e seus escândalos. A oposição correu ao recurso, indignada, mas o gesto de Motta expõe a tentativa clara de transformar a Casa num gabinete remoto para deputados que preferem morar no exterior a responder pela coisa pública.
O truque da “ausência justificada”
Eduardo Bolsonaro está nos Estados Unidos e, mesmo longe, não queria perder o mandato por faltas. Para contornar isso, a bancada opositora se valeu de uma resolução da Mesa Diretora de 2015 que permitia justificativas para ausências nas sessões deliberativas e votações — e, assim, tentou empacotar um atestado de impunidade com selo parlamentar. A manobra era óbvia: transformar a liderança da minoria numa muleta para manter um deputado em um mandato que ele não exerce. A manobra foi transparente: transformar o cargo de liderança da minoria em muleta para escapismo parlamentar.
Hugo Motta, porém, decidiu não homologar a nomeação e classificou a decisão como “estritamente técnica”. “Estritamente técnica”, disse Hugo Motta. A reação da oposição foi imediata: recurso à Mesa Diretora e acusações de censura. O líder do PL, Sóstenes Cavalcante (PL-RJ), afirmou que Motta agiu de forma unilateral e ainda insinuou motivos externos para a guinada do presidente da Câmara. “Nós estamos entrando com recurso na Mesa Diretora. Essa resolução ainda vale. O presidente Hugo Motta não deveria ter tomado a decisão unilateralmente. Ele precisa reunir a Mesa Diretora. Nós não vamos aceitar essa decisão”, disse Sóstenes Cavalcante.
A linha narrativa do PL incluiu até teorias de conspiração: Sóstenes insinuou que Motta teria mudado de postura depois de sanções internacionais atingirem a companheira do ministro Alexandre de Moraes. “A todo momento, o Motta sabia. Ontem, depois da [Lei] Magnitsky na esposa do Moraes, recebi ligação do presidente Hugo Motta dizendo que não poderia cumprir o compromisso comigo. Me estranhou a mudança de comportamento do presidente Hugo Motta”, disse Sóstenes Cavalcante. Caroline de Toni, atual líder da minoria, reclamou da prerrogativa das bancadas e classificou a decisão como uma tentativa de censura: “A escolha se concretiza com a homologação do presidente da Câmara. Ele não pode nem fazer juízo de valor sobre o caso. Isso enfraquece a bancada. É uma tentativa de censura à oposição”, disse Caroline de Toni.
Mas vamos combinar: é preciso ter coragem — ou cara-de-pau — para falar em censura quando se busca usar o regimento como muleta para burlar responsabilidade parlamentar. Está em jogo o mínimo de decoro republicano. Deputado que escolhe a comodidade de outro país e o conforto de uma vida distante precisa responder: por quem trabalha? Pelos eleitores ou por interesses de família e bolsonaristas que espalham impunidade?
Não vamos aceitar que a Câmara se transforme em porta-voz do entreguismo e do cinismo! A disputa por uma cadeira de liderança virou pretexto para mostrar quem realmente defende a coisa pública: do lado da direita, tentativas de blindar aliados ausentes; do lado da sociedade, a necessidade de reconquistar instituições e transformar o Congresso em espaço de defesa do interesse coletivo. E é aqui que o projeto político que sustento entra: precisamos de uma Frente que avance na defesa das estatais, que combata privatizações e que enfrente o capital concentrado — não para colocar médicos no lugar de ladrões, mas para fortalecer um projeto popular de verdade.
A vitória parcial de Motta, se consolidada, é apenas um pequeno recuo no plano maior da direita. Não basta uma decisão técnica: é urgente derrotar politicamente o bolsonarismo, desmontar suas redes de impunidade e fortalecer uma alternativa que tenha o PT e a juventude popular na linha de frente, construindo uma nova etapa de luta anticapitalista. O Parlamento não pode ser refúgio de ausentes; deve ser trincheira de um povo em marcha por soberania, direitos e justiça social.