A pesquisa Ipsos divulgada nesta quinta-feira (25) confirma aquilo que qualquer pessoa que mora nas grandes cidades já sabe na pele: a sensação de insegurança domina a agenda pública — e, enquanto isso, a corrupção reaparece no radar como se a classe política quisesse mostrar que o país continua sendo um balcão de negócios. Os números são claros e inquietantes: 43% dos brasileiros apontam crime e violência como sua maior preocupação, seguida por 38% que citam corrupção e 34% que apontam pobreza. Não é apenas estatística, é reflexo de uma sociedade que vive sob esquemas que alimentam a violência e drenam recursos públicos.
A pesquisa entrevistou 1.000 pessoas entre 18 e 74 anos entre 22 de agosto e 5 de setembro, com margem de erro de 3,5 pontos percentuais para mais ou para menos. No detalhe: crime e violência subiram de 42% para 43%; corrupção avançou de 33% para 38%; pobreza caiu ligeiramente de 35% para 34%; saúde passou de 34% para 33%; e inflação se manteve em 29%. Os números deixam explícito que medo e indignação caminham juntos — medo da rua e raiva do roubo institucionalizado.
“Embora crime e violência siga como o principal temor, mencionado por 43% dos entrevistados, é a Corrupção que volta a ganhar força na agenda pública (…). Este movimento pode estar relacionado à ampla cobertura midiática do julgamento da tentativa de golpe, e também da operação realizada pela polícia federal nas investigações de ações do grupo PCC em esquemas de lavagem de dinheiro em São Paulo”, afirma Marcos Calliari, CEO da Ipsos Brasil. A observação de Calliari não é inocente: a imprensa e as operações policiais têm um papel legítimo em trazer à luz crimes e esquemas — mas isso também funciona como lembrete de que mafiosos políticos e econômicos seguem agindo, muitas vezes com proteção das redes de poder.
A percepção sobre os rumos do país mostra uma leve melhora, mas ainda majoritária em tom pessimista: 59% dizem que o Brasil vai na direção errada (eram 62%); 41% avaliam que está no rumo certo (eram 38%). Sobre a situação econômica, 63% a consideram ruim (eram 67%) e 37% a consideram boa (eram 34%). São sinais de melhora tímida, que não apagam a profundidade da crise social. A ligeira melhora não pode servir de cortina de fumaça: quem lucra com o caos continua ativo e bem alojado nas estruturas do poder.
Comparando com o resto do mundo, os brasileiros estão mais preocupados com a corrupção do que a média global: só 28% dos entrevistados em outros países apontam a corrupção como principal preocupação. Globalmente, crime e violência aparecem em 32%, inflação em 30%, pobreza e desigualdade em 29%. Ou seja, aqui a coisa é mais grave — não por acaso: a combinação entre políticas neoliberais, privatizações e a normalização do uso do Estado para benefício privado deixou marcas profundas.
E o que fazer diante desse panorama? Primeiro, acabar com a narrativa fácil da “lei do mercado” que justifica desmontes e privatizações enquanto os bilionários de plantão assam as mãos sobre o patrimônio público. Segundo, fortalecer instituições democráticas e os mecanismos de fiscalização — polícia, Ministério Público, tribunais — mas sem virar pretexto para autoritarismos seletivos. Terceiro, recuperar políticas públicas que enfrentem a pobreza estrutural e a desigualdade, porque a violência não cai se a miséria e a exclusão persistirem.
A pesquisa é um termômetro: alerta e convocação. Quem quer transformar este país precisa traduzir medo em mobilização e indignação em projeto popular. Não adianta apenas apontar problemas; é preciso disputar poder, defender estatais, barrar privatizações e construir um bloco social que enfrente a direita econômica e seus aliados políticos. Afinal, conversar sobre segurança sem mexer nas causas — desigualdade, corrupção e desmonte do Estado — é como tentar apagar incêndio com gasolina.