A possibilidade do Supremo Tribunal Federal empurrar para 2026 o julgamento de Eduardo Bolsonaro por coação revela, mais uma vez, como os operadores do bolsonarismo tentam transformar crimes políticos em labirintos processuais. A Procuradoria-Geral da República acusa Eduardo e o influenciador Paulo Figueiredo de tentarem interferir no julgamento de Jair Bolsonaro pela tentativa de golpe, incluindo tentativas de pressionar o governo de Donald Trump a impor sanções e tarifas contra o Brasil e autoridades do Judiciário como retaliação. Se o STF aceitar a denúncia, Eduardo pode virar réu — e isso pode torná-lo inelegível. É hora de perguntar: quem protege a democracia — ou quem tenta sufocá‑la com papéis e protocolos?
Por que o julgamento deve ser adiado?
A principal justificativa técnica para o atraso é a fila de processos: há outros quatro núcleos da trama golpista em pauta, e, segundo apurações, o volume torna praticamente impossível analisar o caso de Eduardo ainda em 2025. Além disso, o fato de ele ter sido denunciado em conjunto com Figueiredo, residente nos Estados Unidos, complica ainda mais a tramitação. O ministro Alexandre de Moraes deu 15 dias para que ambos apresentassem defesa, mas a logística internacional equilibra o gesto processual com a velha tática de ganhar tempo.
“Ele é brasileiro, nacional do Brasil, supostamente cometeu um crime nos EUA que afetou o Brasil. Está sujeito à lei penal”, afirmou o jurista Gustavo Sampaio, lembrando o óbvio jurídico que tenta desmentir a invisibilidade política que o bolsonarismo busca impor. O truque da direita de sempre: transformar crimes em tecnicidade processual para ganhar tempo.
A perspectiva é que o STF aceite a denúncia da PGR e torne o parlamentar réu, mas o calendário do tribunal e os entraves provocados pelo deslocamento internacional do co‑acusado podem empurrar o julgamento para 2026. Para nós, que lutamos contra a agenda privatista e autoritária, a pressa por justiça não é capricho: é defesa da democracia popular.
Os problemas práticos não deixam de ser curiosos: notificar alguém que vive fora do país exige recursos e cooperação internacional, algo que deixa claro o caráter transnacional do apoio bolsonarista — igualzinho ao que vimos com a tentativa de atrair interesses estrangeiros contra as instituições brasileiras.
A citação de Figueiredo pode ser feita por meio de endereços ligados a ele no Brasil, por carta rogatória ou até por edital, no caso de esgotarem-se as demais alternativas. “O Ministério da Justiça brasileiro, por meio do Departamento de Recuperação de Ativos e Cooperação Jurídica Internacional (DRCI), faz uma solicitação direta ao órgão responsável no Departamento de Justiça americano, encaminha as peças necessárias e a citação é feita no exterior com validade no Brasil”, explicou o jurista Thiago Bottino, descrevendo o caminho burocrático que o Judiciário pode seguir.
“A citação por edital não é a primeira citação, é feita excepcionalmente quando outros meios não tiveram êxito. A presunção de ciência [do citado] tem que ser válida e razoável, mas é presumido que um cidadão médio tem acesso [à versão online de jornais, que podem ser acessados dos Estados Unidos]”, acrescentou Sampaio, sublinhando que medidas excepcionais não são sinônimo de impunidade. E Bottino foi direto sobre consequências processuais: “Nesse caso, a prescrição também fica suspensa”.
Enquanto isso, a resposta previsível do bolsonarismo ecoou: em nota, Eduardo e Paulo chamaram a acusação de “denúncia fajuta dos lacaios de Moraes na PGR”. Que surpresa: insultos em vez de explicações. A velha estratégia de delegitimar o processo quando as evidências apontam para eles.
A disputa não é só jurídica — é política e moral. Se a direita cruza o Atlântico em busca de proteção e chantageia por tarifas e sanções, devemos responder com firmeza democrática e mobilização popular. Lula e o PT, mesmo em campo eleitoral, são peças centrais na construção de uma etapa de luta que avance contra o capitalismo predador e suas alas autoritárias; não podemos permitir que manobras processuais transformem accountability em perdão de conveniência. A vigilância democrática continua necessária: que o Judiciário faça seu trabalho e que a sociedade exija que a direita pague por suas tentativas de subverter a República.