Em Nova York, durante a Assembleia-Geral da ONU, Lula tentou transformar um aperto de mãos em sinal de maturidade diplomática — e saiu dizendo que ficou satisfeito com o encontro rápido que teve com Donald Trump. Foi um gesto de pragmatismo que mistura charme pessoal, cálculo político e a necessária postura de quem governa um país que ainda resiste às garras do grande capital internacional. Mas será que a “química” entre presidentes apaga as diferenças políticas e as contradições históricas entre Brasil e Estados Unidos? Não se iluda: diplomacia não é encontro de selfies, é disputa de interesses!
O encontro e a diplomacia
No calor da coletiva, Lula respondeu a quem questionou se haveria risco de passar por constrangimentos — lembrando os episódios desconfortáveis promovidos por Trump com outros líderes. Em tom pragmático e até bem-humorado, o presidente colocou a idade como argumento de civilidade: “Somos dois homens de 80 anos”, justificou Lula. Não foi só uma frase sobre anos vividos; foi tentativa de reduzir tensão e afirmar que trato entre chefes de Estado precisa seguir regras mínimas de respeito.
Trump, por sua vez, havia dito na ONU ter sentido uma afinidade imediata depois de um breve encontro nos bastidores: “Tive um rápido encontro com Lula nos bastidores e senti uma química entre ambos”, disse Trump. E o próprio Lula celebrou a “química”: “Pintou uma química mesmo. Satisfação de ter um encontro com o presidente Trump. Aquilo que parecia impossível, deixou de ser impossível e aconteceu”, afirmou Lula. Mais adiante, o presidente destacou que respeitará Trump enquanto ele for presidente dos EUA e espera ser respeitado como presidente do Brasil.
Essas falas podem soar reconfortantes para quem deseja estabilidade nas relações internacionais, e essa estabilidade é necessária quando enfrentamos uma direita que só pensa em privatizar, rasgar direitos e entregar o patrimônio nacional aos bilionários. Mas não se trata de romantizar o encontro: Trump é expressão aberta de uma direita xenófoba e neoliberal, e suas alianças locais — inclusive as que nasceram do bolsonarismo — não mudam por causa de um aperto de mão.
Como militantes e como cidadãos, temos de aplaudir a postura serena de Lula quando ele assume respeito mútuo entre chefes; ao mesmo tempo, é preciso manter a vigilância! Nossa prioridade é outra: garantir que essa cortesia não se transforme em submissão às pautas do capital americano, em concessões às corporações ou em algum novo pacote de privatizações. Lula e o PT representam hoje a esperança de reencaixe da política brasileira no campo popular; mas governo e base social precisam seguir firmes na defesa das estatais, na proteção do trabalho e na luta por soberania.
Não faltaram provocações: jornalistas lembraram das humilhações que Trump promoveu com líderes como Volodymir Zelensky e Cyril Ramaphosa. Lula respondeu com a mesma mistura de ironia e firmeza que o caracteriza, apostando na diplomacia e na firmeza dos interesses nacionais. Isso faz parte da política real — e a habilidade de transformar um “impossível” em “aconteceu” não é menor para quem luta por um projeto popular.
Ao final, o que nos interessa não é a química entre dois octogenários, mas a química entre um governo popular e sua base social — entre governantes e organizações sindicais, movimentos sociais e população pobre que espera mudanças concretas. Se o encontro com Trump abriu portas diplomáticas, que elas sirvam para fortalecer a soberania brasileira, para ampliar cooperações que favoreçam a indústria nacional e para barrar qualquer investida dos bilionários internacionais sobre o nosso patrimônio.
A diplomacia é instrumento; a missão é transformar cada gesto em política que favoreça os trabalhadores. Continuemos cobrando, mobilizando e disputando as narrativas: a direita precisa ser desmantelada politicamente, e Lula — com o PT — deve avançar com firmeza nessa batalha anticapitalista. Afinal, respeito entre presidentes vale pouco se não se traduz em políticas que defendam o povo brasileiro!