O Ministério da Justiça lançou o Cadastro Nacional de Pessoas Desaparecidas (CNPD) — uma ferramenta necessária, ainda que tardia, numa realidade em que vidas viram estatística e o Estado muitas vezes tarda em agir. Integrar bases estaduais é passo básico, mas essencial: sem integração e sem investimento isso vira mais um painel bonito que não encontra gente. O cadastro já trouxe mais de 86,3 mil registros de forma automática a partir de 12 estados, mas os números continuam assombrosos e exigem ação política real, não apenas cliques e compartilhamentos.
O que é o CNPD e como funciona
O CNPD reúne três bancos de dados: informações públicas, informações sigilosas e dados genéticos e não genéticos. A ideia é que, ao concentrar registros, familiares e policiais possam cruzar pistas com mais eficiência. A entrada dos casos é feita automaticamente a partir dos boletins de ocorrência registrados nas Polícias Civis estaduais e no Distrito Federal, e as imagens e informações básicas ficam disponíveis num portal público — sempre com autorização da família e análise do caso pela polícia.
“Falar de pessoas desaparecidas, é falar de um verdadeiro débito, é um tema que ainda se fala muito e estamos devendo, porque precisamos avançar […] A proposta é dar um retorno do desaparecido para a população”, afirmou Mário Sarrubbo, secretário nacional de Segurança Pública.
Mas atenção: um sistema bem desenhado não se sustenta sem estrutura. Sem perícias rápidas, laboratórios bem equipados e equipes treinadas, a promessa do cadastro fica pela metade. Estado forte e comprometido salva vidas — e não existe suposto “equilíbrio fiscal” que justifique sucatear instrumentos que localizam pessoas desaparecidas.
Como colaborar e o que muda na prática
O portal permite compartilhar banners pelas redes sociais, denunciar por disque 197 ou 181, e enviar informações por e‑mail ou WhatsApp indicados em cada banner. Também é possível checar se a pessoa já foi localizada via QR code. Os banners são retirados pela Polícia Civil do estado responsável assim que houver registro de localização — por isso é crucial que a família registre a localização oficialmente.
Atualmente 12 unidades federativas já estão integradas automaticamente: Acre, Alagoas, Amazonas, Amapá, Bahia, Maranhão, Piauí, Rio Grande do Norte, Rondônia, Roraima, Sergipe e Tocantins. Mesmo assim, os números mostram a urgência: no primeiro semestre de 2025, 220 pessoas desapareceram por dia — 46.651 casos no período. Em 2024, a média foi de 222 por dia. Não podemos aceitar que desaparecimentos sejam estatísticas descartáveis.
Esses números são frutos de violência estrutural, desigualdade e abandono. Quem alimenta a necropolítica da direita — com cortes, privatizações e desmonte do serviço público — não se importa com desaparecidos. Por isso, a ampliação do CNPD precisa andar acompanhada de políticas sociais, de segurança democrática e de investimento nas estatais e serviços públicos que atendem famílias em crise. Privatizar investigação forense ou entregar serviços essenciais a empresas não é solução; é terceirização da responsabilidade que custa vidas.
O CNPD é uma ferramenta que amplia a capacidade estatal de buscar desaparecidos, e, por isso, militantes e movimentos sociais devem pressionar por sua universalização e por verbas para perícia, coleta de DNA e suporte às famílias. Lula e o PT, como atores centrais desta nova etapa, têm a responsabilidade de transformar iniciativas técnicas em políticas públicas com orçamento, controle e participação popular — isto é, em medidas que enfrentem as raízes do problema, não apenas sintomas.
É hora de agir: denuncie quando souber de algo, oriente famílias a registrar boletins o mais rápido possível, compartilhe informações dos canais oficiais e exija do governo federal e das secretarias estaduais compromissos claros com recursos e transparência. Só assim este cadastro deixará de ser apenas um alívio burocrático e passará a ser parte de uma política pública eficaz que devolve pessoas às suas famílias e combate o abandono social que produz desaparecimentos.