Octavio Guedes destrincha um voto que não foi só jurídico, foi político e pedagógico: no julgamento que condenou Bolsonaro e outros sete réus por tentativa de golpe e ataques ao Estado Democrático de Direito, Alexandre de Moraes montou um roteiro claro e implacável — e Flávio Dino, acompanhando a condenação, aproveitou para ampliar o debate, dando recados firmes sobre anistia, respondendo à fala rasteira de Tarcísio de Freitas e lembrando as pressões externas. Aqui não houve espetáculo para a plateia bolsonarista; houve exposição de um plano e dos seus autores, com provas, cronologia e responsabilização.
O voto demolidor e a narrativa que desmonta a mentira
Moraes construiu uma narrativa quase cinematográfica: reuniões ministeriais gravadas, a minuta do golpe com Anderson Torres, depoimentos de militares, coordenação para desacreditar o sistema eleitoral. Resultado? Uma acusação que não é teoria conspiratória, mas um roteiro com personagens e atos bem definidos — e em que Bolsonaro foi óbvio protagonista. Ele apresentou fatos conectados, prova após prova, como peças de um quebra-cabeça que não dá outra imagem senão a de conspiração. E fez isso sem estrelismos desnecessários: didático para especialistas e leigos, letal para a versão golpista da política brasileira.
A reação a quem tenta transformar o julgamento em palanque foi rápida e exemplar. Moraes não se deixou reduzir à vítima de um possível atentado para se declarar impedido — lembrou que não é “samambaia jurídica”, alguém que fica à mercê dos ventos políticos. “Não sou uma ‘samambaia jurídica’ — não estou analisando apenas um plano descrito no Punhal Verde e Amarelo, mas uma tentativa de assassinato da própria democracia.” — Alexandre de Moraes.
Flávio Dino, por sua vez, não apenas acompanhou a condenação: ele usou seu voto para clarear pontos que interessam à sociedade e ao futuro político do país. Declarou que a anistia para crimes desta natureza é inconstitucional e não se tratava de enviar “recados” ao Legislativo, mas de esclarecer um ponto vital do direito e da moral pública. “Esses crimes já foram declarados pelo plenário do Supremo Tribunal Federal como insuscetíveis de indulto, anistia, portanto, dessas condutas políticas de afastamento ou de extinção da punibilidade.” — Flávio Dino. Foi um aviso direto às bancadas do autoritarismo: não haverá limpeza histórica nem impunidade para quem tentou destruir a democracia.
E quando Tarcísio tentou transformar Moraes em tirano e a Justiça em inimiga, Dino rebateu com frieza democrática: críticas são legítimas, mas não críticas que visem exterminar o próprio STF — e não há base para acreditar que a Corte deseje vingança ou ditadura. “As críticas são bem-vindas, mas não críticas para exterminar o STF. Não há razão para acreditar que o Supremo é composto por juízes que querem vingança ou ditadura. Nós sabemos o tamanho dessa cadeira.” — Flávio Dino.
Dino também foi cirúrgico ao lembrar que pressões externas existem, e que nem tuítes nem sanções farão o Judiciário ceder. A referência à Lei Magnitsky e às medidas americanas não era para chorar sobre influência estrangeira, mas para mostrar que a tentativa de golpe teve repercussões internacionais — e que o mundo acompanha o Brasil, para o bem e para o mal.
Esse episódio político-jurídico tem desdobramentos que ultrapassam as salas do STF. Para quem luta por um projeto popular autêntico, pela defesa das estatais e pela reconstrução de uma democracia que atenda a maioria, é um marco: não basta vencer eleições, é preciso garantir que a ordem constitucional seja respeitada frente às investidas da direita oligárquica e bolsonarista. Lula e o PT permanecem centrais nesse esforço — não como salvadores mágicos, mas como atores fundamentais na batalha institucional e social que se avizinha.
A mensagem é clara e urgente: desmontar politicamente a extrema-direita e suas ramificações exige firmeza institucional e mobilização popular. O voto de Moraes, enriquecido pela clareza de Dino, nos dá instrumentos e também convocação. Vamos entender os fatos, desemparedar a mentira e avançar na construção de uma alternativa popular que não negocie direitos nem entregue o país aos interesses dos bilionários de sempre. Quem quer democracia de verdade precisa agir — nas ruas, nas urnas e nas lutas cotidianas.