A morte de Miguel Uribe Turbay, jovem senador colombiano e pré-candidato à presidência, não é apenas uma tragédia humana — é um sinal alarmante de que as feridas da violência política na América Latina continuam abertas. Atacado durante um comício em Bogotá em 7 de junho, Uribe lutou por sua vida por mais de dois meses e faleceu nesta segunda-feira (11). A declaração de autoridades brasileiras e o silêncio cúmplice de muitos setores mostram que a democracia segue sob ataque, e que a resposta precisa ser firme e internacionalmente coordenada.
“A morte de um parlamentar, no exercício de sua missão pública, é um ataque à democracia e reforça a urgência de combatermos, com firmeza, toda forma de violência política”, disse Davi Alcolumbre, presidente do Senado. O hospital onde Uribe estava internado também divulgou boletins dramáticos sobre seu quadro: “regrediu à condição crítica devido a uma hemorragia no sistema nervoso central”, informou a Fundação Santa Fé de Bogotá. Esses relatos oficiais confirmam o que já sabemos pelo histórico recente da Colômbia: a democracia pode ser abatida a tiros, e as consequências ultrapassam fronteiras.
O atentado e suas ramificações
Uribe foi atingido por dois disparos na cabeça e um na perna enquanto discursava em evento de rua, em um contexto eleitoral que esquenta para 2026. Quando a política vira alvo, quem governa deixa de ser quem tem votos e passa a ser quem tem poder de fogo. Essa é a realidade cruel que reapareceu na Colômbia, um país que já viu três candidaturas presidenciais assassinadas nos anos 1990 — memórias que não deveriam servir de manual, mas que parecem repetir-se como tragédia anunciada.
O senador tinha 39 anos, era neto de um ex-presidente e filho de uma jornalista sequestrada e assassinada pelo Cartel de Medellín — uma biografia que mistura privilégios de elite e heranças de violência. Ele deixa esposa e um filho. Independentemente de posicionamentos políticos, a morte de um parlamentar em campanha simboliza o fracasso das instituições e a impunidade que garante aos agressões a sensação de poder ilimitado. Não há democracia quando o voto pode ser substituído pela bala.
É óbvio que a escalada de violência beneficia setores retrógrados. Quem lucra com o medo e a desorganização social são os mesmos que defendem o Estado mínimo, a entrega de nossas estatais e o empobrecimento das maiorias. O bolsonarismo e suas ramificações por toda a região alimentam um ambiente onde a militarização do debate público é normalizada e os atiradores encontram justificativa em narrativas de ódio. Não podemos fingir que isso é “acidente político” ou um episódio isolado.
A resposta precisa ir além das notas de pesar protocolares. É preciso investigação rigorosa, cooperação judicial internacional e medidas concretas de proteção a candidatos e a jornalistas — esses que, historicamente, pagam o preço mais alto por denunciar interesses escusos. Ao mesmo tempo, é hora de denunciar o papel das elites econômicas e políticas que estimulam a violência para salvar seus privilégios.
A morte de Miguel Uribe deveria provocar reação coletiva: povos da América Latina não podem aceitar que a alternativa ao voto seja o silenciamento por armas. A esquerda brasileira — e lideranças progressistas na região, inclusive o governo Lula — têm responsabilidade de transformar a solidariedade em pressão política concreta pela apuração dos fatos e por políticas que desmontem os circuitos de violência e impunidade. Se ficar só no discurso oficial, a bala continuará sendo o meio preferido dos conspiradores do retrocesso.
Que a dor de uma família e o luto de um país se transformem em mobilização! Não apenas para condenar um crime, mas para disputar poder, desarmar as redes que financiam o terror político e reconstruir instituições que defendam o direito de disputar eleições sem risco de vida. Só assim a democracia deixará de ser uma promessa frágeis e passará a ser prática cotidiana — e será este, afinal, o maior desmentido às vozes do ódio que insistem em governar pelo medo.