A ocupação da Mesa Diretora da Câmara dos Deputados não foi apenas um ato de vandalismo parlamentar: foi um motim bolsonarista em plena luz do dia, com nomes conhecidos do bolsonarismo sentando-se à força onde deveriam estar as instituições republicanas. Hugo Motta (Republicanos-PB) discute agora o tempo de suspensão dos deputados envolvidos, e os sinais indicam que a Casa pode aplicar o máximo permitido pelo regimento: seis meses. A pergunta que fica é óbvia — seis meses basta para conter essa escalada de impunidade política ou é apenas um remendo para um problema estrutural que continua de pé?
O epicentro do episódio deixou claro o nível de desrespeito ao Parlamento. Entre os que protagonizaram a ocupação estão Marcel van Hattem (Novo-RS), Marcos Pollon (PL-MS) e Zé Trovão (PL-SC). Enquanto Zé Trovão chegou a colocar o pé no caminho da escada para impedir a passagem de Hugo Motta e perguntava aos colegas se liberariam o acesso, Pollon sentou-se na cadeira da presidência e Van Hattem ocupou outra cadeira na posição de comando. Era um espetáculo grotesco: deputados que juraram defender a Constituição transformando o plenário num ringue de vaidades e intimidações. A Câmara precisa usar seu regimento para punir os que institucionalizaram o motim.
A ocupação começou na terça (5) e só terminou na noite de quarta (6), durando 36 horas e paralisando as sessões da Casa. A desculpa? Protesto contra a prisão domiciliar de Jair Bolsonaro, réu por tentativa de golpe e investigado por atrapalhar a Justiça. Tradução: defesa de um líder que tentou subverter a ordem democrática. Esses aliados de Bolsonaro atrasaram votações, forçaram negociações e, no fim, exigiram que Motta negociasse diretamente com quem claramente quer transformar o Congresso numa trincheira do obscurantismo. No Senado houve resistência também — os oposicionistas não quiseram desocupar a Mesa — mostrando que o bolsonarismo aprendeu a se organizar como movimento de pressão institucional, e que nossas instituições têm de responder com firmeza.
“Não vou aceitar chantagem”, disse Davi Alcolumbre a senadores, acrescentando que “não há clima para impeachment de Moraes”. Essa fala revela a tensão entre conciliação e necessidade de proteção das instituições. Há quem prefira negociações discretas e acertos por trás das portas; há quem pense que a melhor resposta é um confronto claro contra a onda autoritária que se organiza nas ruas e nos plenários. Nós, que queremos derrotar a direita e construir um projeto popular, sabemos que conciliação com fascistas é atalho para desastre.
A punição individualizada dos deputados é possível — e necessária. Identificar a conduta de cada um para aplicar sanções é tarefa do regimento e do Congresso. Mas punir não é suficiente se não vier acompanhada de políticas que desmobilizem a base social do bolsonarismo: emprego, educação, defesa das estatais, e uma frente popular que mostre que o projeto anticapitalista do campo progressista é capaz de proteger as conquistas sociais e ampliar direitos. Não se trata apenas de castigo: é defesa da democracia e do trabalho do povo.
Se o país quer sair do ciclo de tumultos e tentativas de golpe, precisa de uma resposta dupla — repressão institucional aos episódios de insurreição política e oferta concreta de alternativas sociais que desmontem o discurso da direita. Enquanto isso não acontecer, a direita continuará testando limites e puxando o país para o abismo. Lula e o PT não podem ser apenas administradores de crises; devem exercer liderança estratégica para transformar essa derrota da direita em impulso para uma nova etapa de luta anticapitalista, fortalecendo as estatais e enfrentando os bilionários que patrocinam o retrocesso. O Parlamento precisa decidir rapidamente: vai proteger a Casa ou permitir que ela seja tomada por quem tenta destruir a própria democracia?