A Medida Provisória 1.303, editada por Lula para recompor receitas em 2026, entrou em cena como remédio amargo numa economia que precisa de recurso para não virar politicamente refém da direita e do ajuste puro e simples. Em linha direta com a necessidade de fechar as contas num ano eleitoral, o governo aposta em tributar ganhos de setores que por anos usaram lacunas e privilégios para construir lucros de curto prazo — e isso incomoda quem sempre foi cúmplice da desigualdade. Mas será que essa irritação é legítima ou é só o pranto dos de sempre, os donos do poder econômico que querem manter a festa intocada?
O que traz a MP 1.303
A MP já está em vigor, mas precisa ser votada até o início de outubro para não caducar. Na prática, reúne medidas variadas: aumento do IOF (já confirmado), elevação da alíquota sobre apostas (de 12% para 18% do GGR), maior tributação dos juros sobre capital próprio (de 15% para 20%), cobrança de 5% sobre LCI/LCA e unificação do IR em 17,5% em aplicações. Também prevê tributos sobre criptoativos (alíquota de 17,5%), eleva a taxação de fintechs e cooperativas para 15–20%, e limita compensações tributárias consideradas abusivas. O governo estima R$ 21 bilhões adicionais em 2026 com essas medidas, e acrescenta que parte do ajuste virá junto com PEC 66 e outras manobras orçamentárias. Não é saque aos pobres — é pedir para que os tubarões paguem a conta.
Resistência dos poderosos
Como era previsível, o setor produtivo e as finanças torcem o nariz. Governos progressistas sempre enfrentam essa fúria corporativa quando ousam mexer no caixa dos privilegiados. A CNI alerta para impacto em investimentos e “falta de clareza” sobre créditos tributários — e pede cortes de despesas em vez de tributos. “O correto seria ampliar o rol de medidas estruturantes de redução de despesas, buscando a contenção e racionalização do gasto público; em vez de focar no aumento da tributação, que já se encontra em patamar muito elevado.” – Confederação Nacional da Indústria (CNI)
Bancos e grandes corporações também falam em insegurança jurídica e retração de mercado. “O debate em torno das alternativas deve ser aprofundado no Parlamento durante a tramitação da MP 1.303.” – Federação Brasileira de Bancos (Febraban) A Abrasca, representando companhias abertas, afirma que alterar juros sobre capital próprio e limitar créditos é um desestímulo ao mercado de capitais. “Há muitas utilizações de crédito dentro do mesmo grupo empresarial… esta proibição é muito grande.” – Pablo Cesário, presidente-executivo da Abrasca
Do outro lado, fintechs e setores que hoje competem com bancos tradicionais avisam que medidas podem reduzir concorrência e acelerar fechamento de empresas menores. “Operação das ‘fintechs’ já é de margem [de lucro] apertada… Vai ter desaceleração muito grande [da atividade], fintechs que vão ter de fechar as portas.” – Diego Perez, Associação Brasileira de Fintechs (ABFintechs)
Os que agora levam o choro aos microfones são os mesmos que lucram com isenções e cambalachos fiscais — e não estão dispostos a ceder nem um centavo dos seus superlucros.
Lula e Haddad colocaram as cartas na mesa: sem recursos, não há espaço fiscal e as responsabilidades cairão sobre quem menos pode pagar. Como militante e jornalista, apoio medidas que façam os ricos contribuírem e que reforcem o papel das estatais e do investimento público — mas não podemos aceitar que o ajuste se transforme em pretexto para cortes profundos em educação, saúde e proteção social. A MP precisa ser defendida no Parlamento, aperfeiçoada onde houver falhas e combinada com uma agenda de reformas estruturais que proteja direitos e ataque privilégios. Afinal, quem tem coragem de enfrentar os bilionários e desmontar a máquina da direita não pode desistir agora — ou vamos deixar que voltem a mandar no país?