luta socialista

PEC da Blindagem naufraga na Câmara entre disputas internas e resistência do Centrão

A tentativa de enterrar a responsabilização política no Brasil — mais conhecida nas rodas do poder como a PEC da Blindagem — naufragou esta semana no plenário da Câmara por culpa do excesso de malabarismos e da própria ganância do Centrão. O combinado inicial era simples: voltar ao texto original da Constituição de 1988, que exigia autorização do Parlamento para abrir processos contra deputados e senadores. Mas quem achou que isso seria suficiente subestimou o apetite dos que não querem prestar contas: líderes tentaram ampliar a blindagem para autorizar inquéritos apenas com aval parlamentar e até criar um quórum especial para julgamentos no STF. Resultado? Confusão, cacetada nos bastidores e a votação adiada — ainda que a ambição por impunidade permaneça intacta.

O episódio expôs a fisionomia real do Congresso: uma coalizão que, numericamente poderosa, chegou a cogitar transformar o foro em um escudo permanente para uma casta de políticos intocáveis. A PEC não era apenas um ajuste técnico à Constituição: era uma peça de engenharia política para transformar imunidade em impunidade. E, como sempre, os articuladores se enroscaram nas próprias manobras. O relator Lafayette de Andrada chegou a ameaçar abandonar a relatoria, perguntando em voz alta de quem seria a redação final — e ficou-se no silêncio constrangedor dos que sabem que o roteiro foi escrito em gabinetes, não em plenário.

Nos bastidores, dois nomes aparecem com destaque: o ex-presidente da Câmara Arthur Lira (PP-AL) e o segundo vice-presidente Elmar Nascimento (União Brasil-BA). Segundo relatos, os dois pressionaram líderes partidários para ampliar o alcance da proposta — o que aumentou a tensão e revelou a lógica clássica do Centrão: mais prerrogativas para a classe política, menos prestação de contas para o povo. Enquanto isso, o PSD e o MDB tentaram frear a onda, alegando que a repercussão seria desastrosa para a imagem da Câmara. “Sou contra qualquer tipo de blindagem para parlamentares e mudança no foro”, Baleia Rossi (MDB-SP). Kassab também bateu o pé, alertando que a medida prejudicaria a reputação do Legislativo: “a repercussão seria péssima para a imagem da Câmara dos Deputados e da classe política”, Gilberto Kassab (PSD).

A pressão não veio só do Centrão. Senadores importantes já se posicionaram contra a proposta — um sinal que mostra que, mesmo num Congresso permeado por interesses, existe resistência à criação de privilégios. “A PEC da blindagem é um retrocesso. Ela transforma a imunidade em impunidade, como um HC (habeas corpus) eterno para uma casta de intocáveis”, Renan Calheiros (MDB-AL). E o presidente da CCJ do Senado, Otto Alencar, também manifestou publicamente sua desaprovação, enfraquecendo ainda mais a ofensiva dos que defendiam a pressa na aprovação.

É sintomático que, no meio desse embate, partidos como PL, União Brasil, Progressistas e PSDB demonstraram força para levar o texto adiante — mas, ao final, a matemática não fechou. Hugo Motta, percebendo que talvez não alcançasse os 308 votos necessários para uma PEC, recuou. Depois de uma semana de negociações e telefonemas, a votação foi adiada para quando? Para uma próxima tentativa — porque o Centrão não desiste fácil de seu intento por manter privilégios.

Enquanto isso, a esquerda e setores que defendem transparência e responsabilização devem tirar lições: a defesa de estatais, serviços públicos e um projeto democrático exige também enfrentar, com firmeza, a cultura da impunidade. Não podemos permitir que uma reforma de regras sirva de manto protetor para corruptos e oportunistas. A batalha para comprometer menos o Estado com interesses privados e mais com o bem comum continua — e passa por vigiar cada manobra parlamentar.

Ao fim, o episódio da PEC da Blindagem revela a necessidade de mobilização popular e de unidade do campo progressista para combater retrocessos institucionais. A tentativa fracassada pode ser adiada, mas não foi derrotada de vez — e cabe a nós, militantes e cidadãos, manter a pressão para que a democracia não seja convertida em proteção para os poderosos.

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