luta socialista

Pedido de baixa de Mauro Cid no Exército concede privilégios financeiros e pode estimular mais oficiais a pedir reserva remunerada

Mauro Cid está agora prestando depoimento ao STF — e enquanto responde sobre a tal “minuta” da conspiração, toma uma decisão prática que revela muito do que há de podre na relação entre as Forças Armadas e a política nacional: pedir a baixa pela chamada cota compulsória. O efeito imediato? Uma indenização equivalente a cerca de oito salários brutos, manutenção do posto e a remuneração integral com soldo e adicionais permanentes. Não é só privilégio — é um sinal de que a máquina de proteção às elites militares continua a funcionar, mesmo quando o personagem em questão aparece envolvido em trama golpista! Quem paga essa conta? O povo, claro.

O que está em jogo

A cota compulsória é um dispositivo do Estatuto dos Militares (Lei nº 6.880/1980) que permite que oficiais mais antigos sejam transferidos para a reserva remunerada, liberando vagas para promoções. A última portaria sobre o tema é de 2022, mas, como informa um militar de dentro do sistema, a regra praticamente não vinha sendo aplicada para tenentes-coronéis, apesar do excesso de oficiais nesse posto. “Embora a cota compulsória esteja regulamentada — a última portaria sobre o tema é de 2022 —, há anos não se registra sua aplicação efetiva para tenentes-coronéis, apesar do número elevado de oficiais nesse posto”, explica um oficial.

A decisão final cabe ao Comandante do Exército, que avalia o efetivo autorizado por lei e decide se abre ou não a cota naquele ano. Ou seja: não se trata de um direito automático do oficial, mas de uma escolha administrativa que pode ser aplicada de forma coletiva. “A solicitação de Mauro Cid pode ainda estimular outros oficiais superiores que não completaram o tempo regular de passagem para a reserva a manifestarem o mesmo interesse. Isso porque a autorização do Comandante do Exército não é individualizada: caso opte por aplicar a regra, ela valerá para todos os oficiais que atenderem aos requisitos e solicitarem a inclusão, e não apenas para um caso específico”, explica um oficial.

É um arranjo que transforma privilégios em política: não é apenas sobre um homem que recebe uma indenização, é sobre um sistema que protege e normaliza privilégios mesmo quando esses homens aparecem ligados a tentativas de golpe. Se o Comandante autorizar, haverá efeito cascata — e a cota compulsória poderá ser usada para “limpar” ou acomodar quadros inteiros, não apenas um nome isolado.

As implicações são claras e perigosas. Primeiro, abre-se uma brecha burocrática que pode servir tanto para aliviar a pressão de uma avenida lotada de tenentes-coronéis quanto para neutralizar politicamente certos núcleos incômodos ao escalão superior. Segundo, mostra o quanto as Forças Armadas continuam a operar com lógica corporativa, distanciada da urgência social que deveria nortear qualquer instituição pública. E terceiro, evidencia a necessidade de vigilância democrática: quem garante que esses mecanismos não serão instrumentalizados para recompensar aliados e punir adversários?

Para nós, da militância socialista, essa movimentação não é um detalhe técnico — é política pura. É preciso confrontar a naturalização desses privilégios e lutar para que as tropas estejam sob controle civil democrático e que o aparato militar não funcione como protecionato de ideias golpistas. Não nos iludamos: a direita bolsonarista, seus simpatizantes nas casernas e o capital que os financia respiram aliviados com qualquer arranjo que preserve regalias.

Se houver um lado positivo, é que a possibilidade de aplicação da cota compulsória expõe o problema e pode abrir espaço para uma disputa maior — por critérios transparentes, por democracia interna nas Forças Armadas e por responsabilização política daqueles que flertaram com a ruptura institucional. É hora de empurrar essa disputa para o campo democrático e popular: fortalecer a mobilização social, apoiar setores progressistas do Estado e confiar na força política de Lula e do PT para desmontar as tramas autoritárias e avançar numa reforma real que coloque o país a serviço do povo, e não de uma casta de privilegiados.

A troca de um oficial por uma indenização não pode ser tratada como nota de rodapé. É uma peça nesse xadrez maior de poder que vamos disputar nas ruas, nas instituições e nas urnas — e que exige clareza: ou derrotamos a direita e seu cercadinho de privilégios, ou continuaremos pagando a conta.

Mais notícias para você
090138a2-e6f7-4f6c-8bfe-f874d840c133
Projeto golpista da Câmara anistia até quem ainda está no ventre da mãe e tenta salvar conspiradores do passado e do futuro

A Câmara dos Deputados virou um teatro do absurdo: um grupo da extrema-direita apresenta um projeto de anistia que mais...

d4fd4b47-eb2b-4c88-9f17-a0332647d492
Centrão e PL articulam anistia na Câmara, mas MDB e PSD no Senado prometem barrar golpe autoritário

Enquanto o Centrão e o PL tramam nos bastidores para enterrar a lei e devolver o perdão aos autores do...

5d80b513-ae08-467c-964d-27a4ed0e9505
Lula e presidente da Comissão Europeia discutem por telefone avanço do acordo Mercosul-UE e compromisso com clima

O presidente Luiz Inácio Lula da Silva manteve nesta sexta-feira (5) uma conversa por telefone com a presidente da Comissão...