A megaoperação da Polícia Federal que desmantelou um esquema bilionário no setor de combustíveis expôs, mais uma vez, a extensão da infiltração do crime organizado na economia — e revelou também o que muitos já desconfiavam: vazamentos e facilitação por dentro permitem que chefes fujam na véspera das batidas. Enquanto Mohamad Hussein Mourad, o “Primo”, e Roberto Augusto Leme da Silva, o “Beto Louco”, seguem foragidos, a corporação abre inquérito para investigar como tanta gente conseguiu escapar sabendo que era alvo. O episódio é sintomático de um país em que a direita desmoralizou o Estado, mas também a prova de que, com vontade política, o aparelho estatal pode reagir.
O vazamento e a fuga dos chefes
Delegados e agentes da DICOR se reuniram para entender o que aconteceu: mais da metade dos investigados não foi localizada, mesmo com monitoramento prévio e mandados expedidos pela Justiça Federal. “O que nos causa grande estranheza é que muitos dos alvos monitorados escaparam de véspera. Temos indicativos de que fugiram de casa um dia antes da operação ou poucos dias antes”, disse um dos investigadores. A suspeita é objetiva: ou houve facilitação de agente público ou vazamento de informações. Em operações desse porte, a prática é justamente a surpresa — deslocamentos, viagens e comportamento dos alvos são acompanhados para que a prisão seja executada sem aviso prévio. Nem sempre isso acontece quando redes de poder paralelo têm braços dentro das instituições.
A investigação envolveu polícia federal, fiscos estaduais e federais, Ministério Público de várias regiões e até a ANP. O trabalho conjunto é o que permite desbaratar esquemas que misturam adulteração de combustíveis, sonegação e lavagem de dinheiro. O próprio fato de haver tantas agências envolvidas mostra a gravidade do que estava em jogo. Mas, se havia coordenação técnica, faltou blindagem contra infiltrações políticas e financeiras que ainda operam no país.
Fintechs, IA e o combate ao apagamento das trilhas
As apreensões realizadas deixaram claro que o PCC não apenas “enterra” dinheiro como nos filmes: hoje ele bancariza, usa fintechs, fundos e uma miríade de artifícios para mascarar transações. O ministro da Fazenda, Fernando Haddad, anunciou que o crime organizado terá de procurar novos caminhos — e prometeu fiscalizar fintechs com as mesmas ferramentas do sistema bancário tradicional. “Tudo isso a nossa IA vai pegar e vamos para cima de quem estiver fazendo coisa errada. Vamos seguir o dinheiro do criminoso”, disse o ministro Fernando Haddad.
Medidas tecnológicas são essenciais, mas não suficientes. Precisamos de instituições públicas fortes, estatais que regulem os mercados e fiscalização robusta — exatamente o oposto do que a agenda privatista e entreguista da direita prega. Privatizações e desmonte do Estado facilitam a vida dos que querem esconder fortunas e corromper processos. Defender empresas públicas e ampliar o controle social sobre setores estratégicos é, portanto, também uma estratégia anti-corrupção.
O episódio mostra duas verdades úteis para quem luta por uma transformação democrática: primeiro, o combate ao crime organizado exige Estado sólido, inteligência e cooperação interinstitucional; segundo, o enfraquecimento do Estado, legado das políticas neoliberais e do bolsonarismo, cria janelas para que mafiosos e bilionários lavem dinheiro e influenciem decisões políticas. A operação desta quinta é só um capítulo de uma guerra que continuará enquanto não fizermos a escolha clara por fortalecer o público sobre o privado.
Se a investigação apontar vazamentos, que se puna exemplarmente — para que a moral do serviço público volte a valer. E se Haddad e o governo Lula realmente querem enfrentar a quadrilha financeira que corrói o país, terão apoio dos que acreditam que o Estado, bem gerido e democrático, é a melhor arma contra os que lucram com o caos. A partir daqui, quem quer reformar o Brasil tem obrigação de transformar esse choque em política: mais transparência, mais fiscalizações, menos espaço para o crime e para a direita entregar nossas riquezas.