A Procuradoria-Geral da República (PGR) foi acionada pelo Supremo Tribunal Federal (STF) para se manifestar em até 48 horas sobre as explicações apresentadas pela defesa de Jair Bolsonaro pelo suposto descumprimento de medidas cautelares determinadas pelo ministro Alexandre de Moraes. As respostas do ex-presidente chegaram ao STF na manhã desta segunda (25) e agora caberá à PGR emitir parecer que pode levar Moraes a endurecer as medidas — ou não. O relógio corre e a política do empurra-empurra jurídico ganha contornos cada vez mais explícitos: estamos diante de uma disputa sobre impunidade, sobre a lenta restauração da ordem democrática e sobre quem, afinal, tem espaço para continuar sabotando o país.
Defesa, narrativas e a tentativa de normalizar o absurdo
A defesa de Bolsonaro não só nega ter descumprido as medidas, como pede a reconsideração da prisão domiciliar imposta desde 4 de agosto. Em sua resposta, os advogados alegam que o relatório da Polícia Federal contém “vazios de indícios”. “há ‘vazios de indícios’ no relatório feito pela Polícia Federal”, disseram os advogados de Bolsonaro. Além disso, classificaram como irrelevante o rascunho de pedido de asilo político na Argentina encontrado no celular do ex-presidente, afirmando que se trata apenas de uma “sugestão” recebida por Bolsonaro em fevereiro de 2024 e depois descartada. “foi uma ‘sugestão’ recebida pelo ex-presidente em fevereiro de 2024, posteriormente descartada”, afirmou a defesa à colunista Andréia Sadi.
Não dá para engolir fácil essa tentativa de transformar planejamento de fuga e documentação pronta para o exílio em uma nota de rodapé. A direita não se envergonha em maquiar a própria covardia como estratégia política. O cenário é claro: se há rascunhos, áudios e articulações, não é coincidência — é padrão de comportamento.
O que a Polícia Federal diz
O inquérito da PF aponta que Bolsonaro e o deputado Eduardo Bolsonaro atuaram de forma coordenada para pressionar ministros do STF, parlamentares e outras autoridades, num esforço explícito de interferir no julgamento em que o ex-presidente é réu. Audios extraídos do aparelho do ex-presidente indicam articulações com Eduardo e com o pastor Silas Malafaia para intimidar e coagir. Segundo a investigação, as movimentações buscavam, em última instância, proteger interesses pessoais e evitar condenações. A polícia indiciou o ex-presidente e aliados por organização criminosa armada, tentativa de abolir violentamente o Estado Democrático de Direito e tentativa de golpe de Estado.
Bolsonaro e seus cúmplices mostraram que preferem a fuga à responsabilização. Não é bravata: é estratégia de sobrevivência política quando faltam argumentos democráticos e sobra disposição para atropelar instituições.
A existência de um arquivo editável de 33 páginas, com campo para a assinatura de Bolsonaro, que configuraria um eventual pedido de asilo na Argentina desde fevereiro de 2024, é peça central desse quebra-cabeça. Ou alguém espera que planos de contingência com layout pronto e local para assinatura sejam apenas “sugestões”? Essa narrativa só se sustenta se aceitarmos que a arte do teatro substituiu o sentido comum.
Enquanto isso, setores conservadores e midiáticos tentam transformar as evidências em meras disputas retóricas, como se intimidar juízes e arquitetar rotas de fuga fosse apenas um mal-entendido entre amigos. Não é. É tentativa de golpe consumada nas urnas e refratada na vida pública.
Se a PGR emitir um parecer firme, Moraes tem munição para impor medidas mais duras; se agir com frouxidão, o recado será claro: a extrema direita segue tendo espaço para chutar o Estado de direito. Do lado progressista e popular, é hora de manter pressão: o país precisa de responsabilização, de reforço das instituições e de avanço de um projeto que enfrente as forças que querem privatizar tudo e transformar direitos em mercadoria. A história não perdoa quem protege quem deve responder pelos atos — e a luta para impedir a volta dos que destruíram o país continua.