O Senado decidiu transformar em prioridade institucional a defesa de um colega alvo de investigação do Supremo. Em vez de concentrar forças no enfrentamento das mesmas oligarquias que corroem a vida pública — aqueles que defendem privatizações, acobertam bilionários e alimentam a violência política — a casa legislativa escolhe abrir gabinetes jurídicos para tentar desbloquear salário e verba de gabinete de Marcos do Val e, assim, preservar privilégios que deveriam ser revistos. O episódio expõe, mais uma vez, a cumplicidade entre as castas políticas e a direita que quer imunidade para os seus.
A ofensiva vem do topo: o presidente do Senado, Davi Alcolumbre, anunciou que o Senado vai recorrer ao STF para reverter as medidas impostas pelo ministro Alexandre de Moraes. “Vamos impetrar ao STF e buscando, no ponto de vista jurídico, institucional, instrumento jurídico, para recorrermos da decisão deferida contra o senador Marcos do Val”, disse Alcolumbre. Não é pouca coisa: a Advocacia da Casa estuda pedir à Justiça a liberação integral do salário e das verbas de gabinete do senador capixaba, bloqueados por decisão do ministro.
O pano de fundo é conhecido: em 4 de dezembro, Moraes determinou que do Val utilize tornozeleira eletrônica após retorno de viagem aos Estados Unidos. Em agosto passado o ministro havia mandado apreender os passaportes do senador e bloqueado R$ 50 milhões em suas contas, no âmbito de investigação sobre ofensas e ataques a investigadores da Polícia Federal. Apesar da determinação, do Val saiu do país com o passaporte diplomático — e agora clama por normalidade. “A minha conta bancária está completamente bloqueada, com toda vida financeira bloqueada, contas bancárias, cartões de crédito, PIX bloqueado, tanto para enviar quanto para receber, tudo bloqueado. Eu não tenho condições de receber doações, nem dos meus colegas, que já se dispuseram a ajudar. Estou 100% sem o meu salário. O meu gabinete está 100% sem ajuda de custo”, lamentou do Val.
A defesa corporativa do Senado
O espetáculo de solidariedade institucional é de dar vergonha: quando se trata de proteger um senador investigado por atacar quem investiga, o Senado vira prontamente uma fortaleza de privilégios. **O Senado está mobilizando sua máquina para proteger um parlamentar sob investigação.** A justificativa é a preservação das prerrogativas do mandato — prerrogativas que, ironicamente, são usadas por muitos para blindar interesses privados e minar as instituições públicas que ainda resistem ao avanço autoritário.
Enquanto isso, corre no Senado a articulação para afastar do Val por até seis meses — uma estrutura que mais parece teatro do que solução. “A suspensão do parlamentar deve ser pedida pelo procurador da Casa, Alessandro Vieira, e depois votada pela Mesa Diretora”, disse o líder do PSB, Cid Gomes. E, conforme anunciado pelos líderes, existe consenso sobre a possibilidade de afastamento: “Alcolumbre quer afastar do Val por 180 dias”, afirmou Omar Aziz. Ou seja: ao mesmo tempo em que há quem peça punição, a própria Mesa se apressa em travar recursos jurídicos para manter a remuneração e as regalias do investigado — equilíbrio de faz-de-conta que mantém intacta a proteção entre pares.
Que lição tirar daqui? Primeiro, que a velha política não deixou o palco: continua a proteger seus e a punir os inimigos das instituições que defendem a democracia apenas quando convém aos seus interesses. Segundo, que ações do Judiciário como as de Alexandre de Moraes — que têm sido alvo de mídia e de direita reacionária — são fundamentais para barrar ataques antidemocráticos; o problema é que, sem uma força política de esquerda organizada, esses avanços ficam à mercê das manobras corporativas do Congresso.
A hora é de atuação política independente e firme. Não basta celebrar decisões judiciais: é preciso que Lula, o PT e as forças populares aproveitem momentos como este para empurrar uma agenda que rompa com privilégios e reforce o Estado democrático contra a sanha privatista e a banalização das prerrogativas. **Ou vamos continuar assistindo ao Senado como varanda para que a direita conserve suas benesses?** O país exige mais: transparência, responsabilização e a construção de uma alternativa popular que não negocie com a impunidade daqueles que atacam a República.