O governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas (Republicanos), saiu às pressas para Brasília — quer dizer, para os Estados Unidos — com o discurso pronto: o tal do “tarifaço” americano é um drama que ameaça o interior paulista e, veja só, também prejudica empresas ianques. Entre entrevistas e agendas na Caravana 3D, Tarcísio mistura preocupação econômica com tentativa de limpar a imagem do bolsonarismo que o apoia. Mas será que esse esforço serve aos trabalhadores e à indústria nacional, ou é só mais um exercício de diplomacia empresarial para salvar patrões amigos?
“A gente tem que levar esse argumento econômico para mostrar que não só nós aqui que estamos sendo prejudicados, como as empresas americanas lá também estão sendo prejudicadas” — Tarcísio de Freitas. O recado é simples: a sobretaxa de 50% imposta pelo governo Trump atinge não só exportadores brasileiros, mas cadeias produtivas que se cruzam entre os dois países. E claro, Tarcísio corre atrás de interlocução: encontros com governadores americanos, contato com o encarregado de negócios da embaixada, departamento de Estado e de Comércio. “Na segunda-feira eu vou estar com um governador de estado norte-americano, estou falando com encarregado de negócio da embaixada dos Estados Unidos…”
Impactos reais, soluções paliativas
O tal tarifaço, que entrou em vigor no início de agosto, aplica 50% sobre parte das importações brasileiras — um percentual considerado o mais alto do mundo. O governador joga luz sobre setores do interior paulista: agronegócio, café, proteína animal e indústrias exportadoras de alto valor agregado. Segundo Tarcísio, periféricos da indústria — como eletrônica e motores — também complicam a equação, porque há exportações que dependem de componentes importados.
“A Volvo por exemplo, manda todo ano R$ 2 bilhões em caminhão articulado e perder esse mercado é ruim para o estado como um todo. Essa tarifa de 50% significaria perder o negócio…” — Tarcísio de Freitas. A imagem é clara: fábricas ameaçadas, empregos em risco, negociações que migram para fábricas suecas ou outras com tarifas menores. O estado que mais perde com isso é um estado que exporta muitos produtos de alto valor agregado, diz ele, tentando pintar-se como salvador da indústria paulista.
As medidas anunciadas pelo governo estadual soam mais como remendos de emergência do que uma política industrial transformadora: linha de crédito de R$ 400 milhões com juros subsidiados de 0,27% ao mês mais IPCA, prazo de cinco anos e carência de um ano; e liberação recorde de créditos acumulados de ICMS de R$ 1,5 bilhão. Haverá conversas com o Japão para abrir mercados à proteína animal paulista. Tudo isso é necessário? Sim. Suficiente? De jeito nenhum.
Enquanto Tarcísio negocia com empresas e diplomatas, é impossível não lembrar do recado paralelo que ele próprio deu semanas atrás, preocupado com “pessoas sendo investigadas simplesmente por fazerem críticas” após vazamentos envolvendo Bolsonaro e Eduardo. “pessoas sendo investigadas simplesmente por fazerem críticas” — Tarcísio de Freitas. Hipocrisia? Talvez. Protege-se a elite exportadora, mas recua quando a crítica atinge o seu campo político.
A verdade é que o problema exposto — a fragilidade da indústria e a dependência de mercados estrangeiros — não se resolve com linhas de crédito temporárias e passeios diplomáticos. É preciso uma estratégia nacional que priorize estatais fortes, políticas industriais, controle sobre setores-chave e, acima de tudo, soberania nas negociações comerciais. Onde estão essas propostas do bloco conservador que hoje clama por ajuda internacional? Sumiram quando precisaram defender o interesse público contra golpes e privatizações.
O episódio expõe duas verdades: a direita, mesmo quando se mostra “preocupada” com a indústria, age tardiamente e a reboque dos patrões; e sem um projeto popular, democrático e anticapitalista que recupere o papel do Estado como protagonista, continuaremos reféns de tarifas, chantagens comerciais e das decisões de millonários de outros países. É hora de unir trabalhadores, movimentos sociais e governos comprometidos com o povo para construir autonomia produtiva — porque tapa-buraco financeiro não segura fábrica nem gera emprego digno.