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Um mês após ocupação da Mesa da Câmara, deputados seguem impunes e avanço de punições no regimento está paralisado

A ocupação da Mesa Diretora da Câmara por aliados de Jair Bolsonaro completa um mês em clima de impunidade e hipocrisia institucional. Enquanto a direita faz teatro de rua dentro do plenário e tenta transformar o legislativo num palco de obstrução e chantagem política, a Casa permanece lenta, acomodada e disposta a enterrar qualquer punição que possa desagradar a turma do palanque. O resultado? Um aviso claro aos bolsonaristas: podem provocar, pressionar e ameaçar — que a máquina do poder vai arrumar tempo para não incomodar.

O motim e a resposta burocrática

No início de agosto, deputados da oposição ao governo Lula impediram o funcionamento da Câmara ao ocupar fisicamente a Mesa Diretora, em protesto contra a prisão domiciliar do ex-presidente decretada pelo ministro Alexandre de Moraes. A cena foi vergonhosa: um deputado, Marcel Van Hattem (Novo-RS), chegou a barrar o presidente da Câmara, Hugo Motta (Republicanos-PB), de sentar na cadeira. A imagem deixou Motta fragilizado — e mostrou que os golpistas de plantão ainda apostam no empurra-empurra institucional para tentar impor sua agenda.

Diante do motim, Motta chegou a cogitar um rito sumário para suspender cautelarmente os responsáveis — um procedimento rápido que poderia ter resolvido a afronta em poucos dias. Mas, claro, não teve apoio da Mesa e decidiu enviar as representações disciplinares ao corregedor, deputado Diego Coronel (PSD-BA). O rito rápido foi substituído por um prazo elástico: agora a corregedoria usa até 45 dias para elaborar pareceres, prazo que, no mundo real, significa “esfriar o caso” e garantir que ninguém pague preço político.

Enquanto isso, os deputados envolvidos já apresentaram suas defesas e os relatórios caminham lentamente. A sensação é a de sempre: fazer barulho, testar limites e contar com o tempo e as manobras regimentais para evitar punição.

Alteração de Regimento e negociação por baixo da mesa

A Mesa Diretora protocolou um projeto de resolução para alterar o Regimento Interno e o Código de Ética e punir fisicamente a obstrução do plenário — proposta que determina suspensão do mandato para quem “impedir ou obstaculizar, por ação física ou por qualquer outro meio” o funcionamento legislativo. A ideia era usar também o rito sumário quando for cabível, para permitir suspensão provisória sem longa espera.

Mas a proposta está parada. O relator escolhido foi Gilberto Abramo (Republicanos-MG), aliado de Motta, o que provocou choque e desconfiança entre parlamentares. Alguns avaliam que a escolha do relator foi o fim do projeto antes mesmo de começar: dizem que Abramo estaria negociando com a oposição — os mesmos que promoveram o motim — e que o texto ficou engavetado estrategicamente.

“Eu sou o maior interessado em seu andamento de forma célere, e, por isso mesmo, fui designado relator. Temos que levar em conta o momento, que não é adequado, porque poderia soar como uma perseguição, e essa não é a ideia” — Gilberto Abramo (líder do Republicanos)

Traduzindo: em vez de proteger a Câmara, Abramo protege quem atacou a Câmara. Que lindo exemplo de coerência republicana!

Para completar o cenário, o pedido de urgência foi aprovado, mas o mérito jamais chegou à votação. A pauta sequer voltou às reuniões de líderes que organizam a semana legislativa. Resultado prático: teatro dos obstruidores e teatro dos negociadores.

Anistia em cima da mesa
Como se não bastasse a pasmaceira diante da obstrução física, a bancada que promoveu o motim empurra com prioridade a pauta que lhes interessa: a anistia aos envolvidos no episódio do 8 de janeiro — e, pasmem, há quem sonhe em anistiar até Bolsonaro de eventuais condenações no STF. O líder do PL, Sóstenes Cavalcante, já tratou do assunto com Motta.

O quadro é claro: a direita tenta usar a Câmara como moeda de troca para garantir impunidade e revanche. Do outro lado, Lula e o PT aparecem como as forças capazes — não só eleitoralmente, mas politicamente — de enfrentar esse avanço. Resta saber se as instituições, a militância e os setores democráticos vão aceitar o empurra-empurra ou vão reagir para que a Câmara deixe de ser quintal de golpistas e volte a ser espaço de debate e defesa da Constituição. A hora de decidir é agora: ou desmontamos esse projeto autoritário nas urnas e nas ruas, ou teremos de conviver com a naturalização da violência política dentro do Congresso. Quem vai pagar o preço da acomodação?

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